Manifesto Editorial da Revista Palavra de Ordem

Via Revista Palavra de Ordem

O Brasil atravessa uma profunda crise econômica, social e política. Em meio a isso, a única força social capaz de oferecer uma solução historicamente progressiva para esta crise, a classe trabalhadora, vive, também, uma crise organizativa e ideológica. Contudo, a despeito do que propaga o desespero distópico (que alimenta incontáveis matizes de oportunismo ou apatia), as pessoas pensam. Assim sendo, diante de tamanhas convulsões históricas, a consciência popular é atravessada por uma revolução teórica.

Após o desmonte capitalista da União Soviética, o liberalismo predominou triunfalmente como concepção de mundo, proclamando o “fim da História”. Sob o domínio global dos interesses mercantis capitalistas, a verdade foi declarada proscrita, e a existência humana foi relegada ao reino das opiniões e das narrativas. Arrancada à história, a verdade foi declarada domínio técnico dos intelectuais mercenários, relegada a algum lugar lugar alheio às massas, seja aos cofres dos tecnocratas dos bancos internacionais, seja às salas de aula dos catedráticos universitários. Declarado morto o sujeito revolucionário da história, o proletariado como classe, a verdade foi arrancada à luta de classes e depositada exclusivamente nas mãos de um sujeito-suposto-saber institucional, forma reificada do conhecimento social, sob a benção do chamado “discurso universitário” da modernidade burguesa.

Empunhando a bandeira do liberalismo, a classe dominante trouxe a humanidade à beira do precipício: a violenta crise econômica, que precipita a burguesia contra o proletariado e seus estreitos direitos, preparou o terreno para a crise das democracias burguesas e do seu complemento necessário: a política operária liberal de conciliação de classes e de legalização da luta proletária.

Agora, quando a classe dos grandes proprietários capitalistas e seus ideólogos chafurdam no pântano do obscurantismo reacionário, e quando as antigas lideranças da esquerda constitucional não podem oferecer nada além de hesitação e histeria, cada vez mais trabalhadoras e trabalhadores se armam de um espírito de cisão com a ordem capitalista vigente e buscam, sob uma ou outra forma, o caminho para sua emancipação através da práxis revolucionária – a unidade entre a atividade militante e a instrução teórica.

Nas décadas anteriores, a contrarrevolução ideológica operou uma profunda ruptura orgânica entre o movimento proletário e a intelectualidade radical – que, desacreditada perante as massas pelos mais diversos erros de seu próprio movimento revolucionário, refugiou-se em carreiras docentes e encastelou-se em “linhas de pesquisa” cada vez menos ligadas às problemáticas prático-teóricas do movimento socialista, e da luta pela hegemonia do proletariado revolucionário no movimento social. Hoje, porém, conforme avançam por toda a parte as lutas entre as classes, cada vez mais surge em meio à massa do povo pobre uma nova geração de intelectuais orgânicos do movimento proletário e popular; cada vez mais e mais forças intelectuais e literárias se destacam, através de sua própria instrução, em meio à luta social. A cada dia mais se comprova a assertiva de que, “na sua luta, os trabalhadores por toda a parte se revelaram como os intelectualmente e moralmente superiores, e provaram notadamente nos seus conflitos com os patrões que agora são eles, os trabalhadores, as pessoas cultas, e os capitalistas os boçais”.

Isso não significa dizer que todas as forças literárias e pedagógicas contidas nas instituições universitárias burguesas devam ser menosprezadas. Pelo contrário. Ao lado da organização das forças intelectuais não-universitárias do movimento revolucionário, é preciso, urgentemente, arrancar a intelectualidade radical da zona de conforto profissional e dragá-la irresistivelmente para a tarefa política candente de nossa época: a preparação do proletariado e do povo pobre para a luta pelo poder e pelo socialismo. É preciso combater em todas as trincheiras sociais pela hegemonia das forças revolucionárias do proletariado – inclusive nas universidades. Mas é preciso, antes disso sequer ser possível, cultivar o espírito de cisão para com a ordem existente; é preciso, elevando o grau de organização e consciência da classe trabalhadora, construir sua independência (pré-condição de sua luta por hegemonia), para que o proletariado não figure apenas como apêndice da ala esquerda da ordem, da política democrático-radical das classes médias.

Em outras palavras: é preciso fazer da atividade revolucionária (sob as mais diversas formas organizativas), e não das instituições educacionais burguesas, o locus histórico da verdade. O surgimento da presente revista teórica pretende contribuir para a solução dessa tarefa histórica, viabilizando um âmbito não-universitário de debates e estudos para a intelligentsia proletária de nossa época.

Avançando em nosso objetivo de consolidar um aparelho de publicações capaz de dialogar com o amplo espectro da esquerda radical brasileira e lusófona, a revista “Palavra de Ordem” permite a colaboração de diversos matizes do pensamento militante nacional e internacional – incluindo movimentos sociais e organizações políticas populares – na produção de reflexões sobre as lutas políticas e sociais, cultura, filosofia, ciências e muitos outros assuntos.

Nossa rosa vermelha busca crescer nos interstícios do concreto midiático, na demanda por informação e reflexão que não encontra saída nos ladrilhos bem assentados da ideologia contemporânea. Pois, aliado a cada luta imediata, é o labor sobre a palavra – ou seja, o trabalho do sujeito sobre as intermitências da significação – a única saída para que formulemos uma crítica vigorosa, capaz de nos livrar da reprodução ideológica e material da sociedade do capital.

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Chamada para contribuições para a 1ª edição.

Estatuto

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A Revista Palavra de Ordem convida pesquisadores(as) para integrar o Conselho de Pareceristas do periódico.
 
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2 comentários em “Manifesto Editorial da Revista Palavra de Ordem”

  1. Não sei se esse é o espaço correto, mas gostaria de fazer uma sugestão. Uma amiga, já falecida, me deu de presente um livro em francês, adquirido no México e intitulado “Les questions du mode de vie”, traduzido do russo por Joëlle Aubert-Young, Paris: Union Générale d’Éditions (10ǀ18) 1976, 104p. Autor: Léon Trotsky, publicado originalmente em 1923. Minha amiga sabia do meu interesse pelo tema e acreditou que eu pudesse lê-lo com o auxílio de um dicionário e é o que venho fazendo pela 3ª vez. Acredito que o livro, como diria um português, está a merecer uma crítica ou um comentário, já que levanta uma série de pontos capazes de ajudar o nosso conhecimento a respeito da nossa própria classe trabalhadora, claro, fazendo as necessárias ressalvas e adaptações. Além disso, não ouço nem vejo ninguém falar sobre essa obra. Existem duas traduções: uma da editora [Nova] Antídoto e outra da Sundermann. Quanto à Palavra de Ordem e à Lavra Palavra, vale a pena acompanhar e colaborar, sempre que possível. Obrigado e forte abraço, camaradas.

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