A luta ideológica no movimento operário

Por Vladímir Ilitch Lênin, via marxists.org, traduzido por Pedro Furtado,

Publicado no Put Pravdi, nº 77, em 4 de maio de 1914.

Uma característica distintiva extremamente importante da Rússia pós-revolucionária é a profunda reviravolta ideológica entre a oposição ou estratos progressistas. Quem se esquece desse aspecto se priva da oportunidade de compreender tanto a revolução russa e seu caráter, quanto as tarefas da classe trabalhadora na era moderna.

A virada ideológica da burguesia liberal se expressa na ascensão de uma tendência antidemocrática (Struve, Izgoiev e V. Maklakov abertamente, o resto dos Kadets secretamente, “timidamente”).

Entre os democratas essa mudança se expressa na absoluta confusão e vacilação ideológica, que prevalece tanto entre os social-democratas (democratas proletários) quanto entre os socialistas revolucionários (democratas burgueses). Até mesmo os melhores representantes da democracia se limitam apenas a lamentar essa confusão, vacilação e retrocesso. Os marxistas, entretanto, olham paras as raízes de classe desse fenômeno social.

O principal sintoma dessa desintegração é o liquidacionismo. Essa corrente foi definida já em 1908 oficialmente como: “uma tentativa de parte dos intelectuais do partido de liquidar” a clandestinidade e a “substituir” por um partido operário legal, definição ratificada por “todo o corpo marxista”. Na última reunião oficial dos dirigentes marxistas, realizada em janeiro de 1910, estiveram presentes representantes de todas as “tendências” e grupos, e não houve uma pessoa sequer que tenha protestado contra a condenação do liquidacionismo como uma manifestação da influência burguesa sobre o proletariado. Essa condenação, que é também a explicação das raízes de classe do liquidacionismo, foi adotada por unanimidade.

Mais de 4 anos se passaram desde então e a vasta experiência do movimento operário de massas forneceu milhares de provas de que essa avaliação do liquidacionismo é correta.

Os fatos mostraram que o marxismo e a experiência prática do movimento operário de massas mataram o liquidacionismo, que é uma tendência burguesa e antioperária. É suficiente recordar como em um único mês, março de 1914, a Gazeta Severnaia Rabochaya difamou a “imprensa ilegal” (edição de 13 de março) e manifestações “clandestinas” (o sr. Gorski, na edição de 11 de abril), aquilo que o sr. Bulkin também denunciou de uma forma completamente liberal (Nacha Zaria 3), e como o notório L. M, em nome dos editores do Nacha Zaria, apoiou totalmente Bulkin nesse ponto e defendeu a “organização de um partido operário legal”. É suficiente relembrar tudo isso para entender por quê a atitude dos operários com consciência de classe para com o liquidacionismo não pode ser nada mais que não a condenação impiedosa e o completo boicote dos liquidacionistas.

Mas aqui há uma questão muito importante: como essa tendência surge historicamente?

Ela surgiu no curso dos 20 anos de ligação do marxismo com o movimento operário de massas na Rússia. Até 1894-1895 não havia tal relação. O grupo Emancipação do Trabalho só lançou as bases teóricas para o movimento social-democrata e deu o primeiro passo na direção do movimento operário.

Foi só a propaganda de 1894-95 e a greve de 1895-96 que estabeleceram laços firmes e inquebráveis entre a social-democracia e o movimento operário. Imediatamente uma luta ideológica começou entre as duas tendências do marxismo: a luta entre os “economicistas” e os marxistas consequentes ou (mais tarde) os iskristas (1895–1902), a luta entre os mencheviques e os bolcheviques (1903-08) e a luta entre os liquidacionistas e os marxistas (1908-14).

Economicismo e liquidacionismo são duas formas diferentes do mesmo oportunismo intelectual pequeno-burguês que existe há 20 anos. É um fato inconteste a conexão pessoal, e também ideológica, que existe entre todas essas formas de oportunismo. Basta mencionar o nome do líder dos economicistas: A. Martínov, que posteriormente tornou-se um menchevique e agora é um liquidacionista. É suficiente lembrar as declarações de alguém como G. V. Plekhánov, o qual em muitos pontos esteve próximo dos mencheviques, mas, no entanto, admitiu abertamente que os mencheviques absorveram elementos oportunistas intelectualistas nas suas fileiras, e que os liquidacionistas deram continuidade aos erros dos economicistas e foram desorganizadores do partido operário.

Pessoas que (como os liquidacionistas e Trótski) ignoram ou falsificam esses 20 anos de história de luta ideológica no movimento operário causam tremendo dano aos operários.

Um operário que adota uma atitude indiferente diante da história de seu próprio movimento não pode ser considerado alguém com consciência de classe. De todos os países capitalistas, a Rússia é um dos mais atrasados e mais pequeno-burgueses. É por isso que o movimento operário de massas deu origem a uma ala pequeno-burguesa e oportunista dentro do movimento; não é algo por acaso, mas inevitável. 

O progresso feito durante esses vinte anos para livrar o movimento operário da influência da burguesia, do economicismo e do liquidacionismo foi enorme. Pela primeira vez, está sendo seguramente estabelecida uma base proletária real para um partido marxista de fato. Isso é tão amplamente reconhecido que até mesmo os oponentes dos pravdistas são obrigados a reconhecer que, entre os operários com consciência de classe, os pravdistas constituem a grande maioria. O que a “plenária” marxista de janeiro de 1910 reconheceu teoricamente (que o liquidacionismo é uma “influência burguesa no proletariado”), os operários com consciência de classe estão colocando em prática há quatro anos. Sua atuação prática demonstra isso através do enfraquecimento dos liquidacionistas, da remoção deles de seus postos e da sua redução a um grupo de publicistas oportunistas que estão fora do movimento operário de massas.

Durante esses 20 anos de confronto de ideias, o movimento operário na Rússia tem crescido em escopo e força, além de amadurecer contínua e firmemente. Derrotou o economicismo e o melhor do proletariado com consciência de classe aliou-se aos iskristas. Em todos os estágios decisivos da revolução eles deixaram os mencheviques em minoria, mesmo o próprio Levitski teve que admitir que as massas operárias seguiam os bolcheviques.

Agora, finalmente, derrotou o liquidacionismo e, graças a isso, tomou o caminho correto da ampla luta da classe avançada pelas principais tarefas históricas da humanidade, iluminada pela teoria marxista e generalizada em palavras de ordem íntegras.

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