Oportunismo e a liquidação da III Internacional

Por Timothy Dirte, via The International Magazine, traduzido por Lauro Abelha

O Partido Comunista sempre se uniu aos trabalhadores nas suas lutas por demandas imediatas sob o capitalismo, como melhores salários, melhores condições de trabalho e ambientes de trabalho mais seguros. É isso que geralmente constitui a política de Frente Única. Seu objetivo é unificar a classe trabalhadora contra os ataques capitalistas, e era a posição do Comintern até o seu VII Congresso.

A situação que precedeu a crise geral do capitalismo mundial antes da Segunda Guerra exigia essa política basicamente correta, assim como a de lutar fortemente contra as forças de esquerda que, em última análise, servem para enfraquecer e quebrar a resistência dos trabalhadores contra a agressão capitalista. Com o efeito prático sendo a vitória do fascismo se os trabalhadores forem derrotados. Essas forças são o que chamamos de social-fascistas.

De todo modo, uma vez que a vitória do fascismo foi alcançada na Alemanha, Itália e Japão, as condições exigiram uma política mais avançada. A presença do fascismo teve um efeito deletério em todo o mundo e ameaçava derrubar toda a humanidade com ele. A luta contra os social-fascistas já não podia ser levada da mesma forma.

A situação internacional exigia uma política de Frente Popular. Ela difere da Frente Única pois a sua base de unidade se estende para além da classe trabalhadora e busca unir todo um povo, os elementos progressistas que por uma razão ou outra se opunham ao fascismo e aos capitalistas que descarregam a crise sobre os trabalhadores.

Além disso, a fortaleza do socialismo mundial, a URSS, estava sob ameaça de invação pelas forças fascistas alemãs. A defesa da posição internacional do comunismo exigia uma aliança tácita na linha do antifascismo entre o campo socialista e o campo capitalista que não caiu no fascismo. Dimitrov, secretário do Comintern, explica o raciocínio para isso no VII Congresso do Comintern em 1938:

Nós, comunistas, empregamos métodos de luta diferentes dos dos outros partidos; mas usando nossos próprios métodos de combate ao fascismo, nós, comunistas, também apoiaremos os métodos de luta usados por outros partidos, por mais inadequados que pareçam, se esses métodos forem realmente dirigidos contra o fascismo.

Estamos dispostos a tudo isso porque, nos países de democracia burguesa, queremos bloquear o caminho da reação e a ofensiva do capital e do fascismo, barrar a abolição das liberdades democrático-burguesas, a vingança terrorista do fascismo selvagem sobre o proletariado e a seção revolucionária do campesinato e dos intelectuais, e salvaguardar a geração jovem da degeneração física e espiritual.

Estamos dispostos a tudo isso porque nos países fascistas queremos preparar e acelerar a derrubada da ditadura fascista.

Estamos dispostos a tudo isso porque queremos salvar o mundo da barbárie fascista e dos horrores da guerra imperialista.

Nosso Congresso é de luta pela manutenção da paz, contra a ameaça de guerra imperialista.

A luta do povo francês, liderada pelo Partido Comunista da França na linha da Frente Popular contra a onda crescente do fascismo antes da Segunda Guerra Mundial, se provou eficaz em impedir a ascensão do fascismo na França antes de Hitler invadir. A determinação do povo francês de resistir ao fascismo foi uma bênção para o movimento antifascista mundial. Mesmo com a derrota da França durante a Guerra, seu povo continuou a luta antifascista, representada pela determinação heróica dos partisans franceses.

O Partido Comunista dos EUA buscou o mesmo sucesso enquanto os tentáculos do fascismo se arrastavam sobre o nosso próprio país na esteira da Grande Depressão. A ameaça do fascismo nos EUA era real e apresentava uma situação revolucionária como Stalin destacou no CEIC (Comitê Executivo do Comintern) em 1929 [https://www.marxists.org/reference/archive/stalin/works/1929/cpusa.htm]. O capital financeiro dos EUA tentou derrubar a república burguesa duas vezes: primeiro com a American Liberty League [Liga da Liberdade Americana], e alguns anos depois com o America First Committee [Comitê “Primeiro América”].

Como Dimitrov e Stalin ressaltaram no VII Congresso, os fascistas vasculham a história e a usam ou revisam para validar e obter apoio para seus objetivos antidemocráticos e antipopulares. O secretário-geral do CPUSA, Browder, assumiu a tarefa de combater isso tentando mostrar o lado progressista da história americana que os capitalistas muitas vezes obscurecem e suprimem.

Simultaneamente, a cooperação entre a União Soviética e os EUA em esforços antifascistas produziram grandes expectativas sobre a possibilidade de uma aliança duradoura. Na verdade, o sentimento era tão pronunciado que muitos na liderança do partido passaram a ver a burguesia americana como basicamente progressista, além do contexto da Frente Popular Antifascista.

Durante a guerra, o Partido chegou ao ponto de restringir a sua agitação entre os trabalhadores para promover alianças com as forças de centro-esquerda. Isso significava cessar as críticas aos social-democratas e afins, bem como acabar com a educação política dos trabalhadores para aprofundar as relações com as organizações burguesas ou mesmo chamar a atenção para as políticas antitrabalhistas dos grandes capitalistas.

Para alcançar a unidade necessária para a Frente Popular, era necessário o conceito de Unidade Nacional. Esse conceito era essencialmente uma aliança de todas as classes contra o fascismo. Como Browder explicou em Victory – and After [“Vitória – e depois”], tinha o objetivo de “unir toda a nação, incluindo os maiores capitalistas, para uma busca completa e total pela vitória”.

A derrota do fascismo, conforme argumentado por Dimitrov e Stalin, exigia que o partido defendesse os elementos progressistas de nossa história nacional, que abrisse o escopo da nossa agitação para apelar a todos os elementos da sociedade e liderar o povo americano contra o fascismo. Isso significava que o partido apelaria para sentimentos burgueses cultivados entre o povo em relação aos “Founding Fathers” [“Pais Fundadores”] e à primeira Revolução Americana. Isso ficou evidente com a “democracia jeffersoniana” sendo consagrada na constituição do CPUSA e defendida como o caminho americano para o comunismo.

Em 1940, todavia, o CPUSA deixou o Comintern para promover sua política de Unidade Nacional. Isso porque os aliados capitalistas acusavam o Comintern de fomentar a “bolchvização” dos EUA e outros. Para que a política do Partido fosse bem-sucedida, era necessário que fizesse qualquer esforço para provar o seu compromisso com o povo americano e seus interesses nacionais. Temia-se que se não tivessem deixado o Comintern a campanha da Unidade Nacional seria prejudicada. De fato, Browder argumentou depois em 1944, após a conferência de Teerã, que era essencial para o Partido Comunista não “empurrar” os elementos progressistas do capital dos EUA para a reação.

Por causa da política de Unidade Nacional, e trazendo para a aliança tanto os trabalhadores como os grandes capitalistas contra o fascismo, diziam que isso exigia um interesse progressista dos grandes capitalistas. Browder sugeriu, em seu trabalho de 1944, Teheran – Our Path in War and Peace [“Teerã – Nosso Caminho na Guerra e na Paz”], que essa Unidade Nacional foi possível em parte devido à imaturidade do capitalismo e de suas classes nos EUA que não conheciam totalmente seus próprios interesses ou posições de classe. Seu último ponto foi que o capitalismo dos EUA consistia numa peculiaridade do capitalismo mundial, ou seja, não estavam vinculados às mesmas leis da economia política capitalista que valiam para todos os outros países capitalistas.

Esse interesse progressista estava nas preocupações pequeno-burguesas por “liberdade de empreender”. Nessa linha de apelo à preocupação do capital norte-americano com a “livre empresa”, restava a Frente Popular Antifascista, ou seja, a aliança entre o CPUSA e a burguesia dos EUA para refividir o mercado mundial. E essa “peculiaridade” da imaturidade do capitalismo dos EUA teria se originado das mesmas condições dos EUA que deram origem à “democracia jeffersoniana”. Isso se referia a um período particular dos EUA que viu Jefferson eleito em uma campanha popular contra latifundiários e banqueiros que retardavam o desenvolvimento da indústria.

A campanha de Jefferson consistia tanto de elementos da classe trabalhadora quanto da burguesia industrial que foi impedida de se desenvolver sob as condições dos latifundiários monopolistas, também conhecidos como a classe dos plantadores, ou especuladores de terras. Esta unidade dos trabalhadores americanos e elementos da burguesia em oposição a certas formas de monopólio (particularmente proprietários de terras e de escravos) formou a base da “peculiaridade” do capitalismo dos EUA, que o diferenciava do capitalismo mundial. Os valores americanos que compunham essa unidade, como direitos de liberdade de expressão, reunião, adoração, julgamento por júri, expansão do direito de voto e outros, ajudaram a capacidade de Jefferson de ganhar o apoio da burguesia nascente.

Já em 1938, essa perspectiva sobre Jefferson e o capitalismo dos EUA se tornou a linha do partido: “Uma aplicação plena e completa dos princípios de Jefferson, a aplicação consistente de idéias democráticas às condições de hoje, levará natural e inevitavelmente ao programa do Partido Comunista, à reorganização socialista dos Estados Unidos, à propriedade e operação comuns da nossa economia para o benefício de todos.” No entanto, quatro anos antes, em 1934, o slogan “Comunismo é o americanismo do século XX” já havia sido popularizado pela liderança do partido. E aqui o conceito de “americanismo” se refere aos ideais democráticos da democracia jeffersoniana, um conceito totalmente burguês.

Com esse fundamento de uma essência progressista do capitalismo dos EUA, o contexto da unidade entre os campos capitalista e socialsita contra o fascismo assumiu uma perspectiva diferente daquela pensada inicialmente como uma aliança estratégica tácita. Não apenas a possibilidade de um interesse progressista entre os capitalistas passou a ser considerada pela liderança do partido, mas a sua atualidade. E se os EUA representam uma forma progressista de capitalismo capaz de levar pacificamente, inevitavelmente, ao comunismo, então o trabalho dos comunistas deveria ser ajudar o desenvolvimento do capitalismo nos EUA.

Essa campanha de unidade com os interesses nacionais da burguesia estadunidense, na sua guinada progressista contra o fascismo, exigia, também, que, no espírito de provar o compromisso comunista com os EUA, o partido se retirasse do Comintern em 1940. Isso porque os “aliados” capitalistas não desperdiçaram esforço em acusar todos os partidos comunistas e o próprio Comintern de agir num esforço conjunto para “bolchevizá-los”. É uma acusação de longa data ao partido de receber ordens de Moscou. Stalin explicou a dissolução à Reuters logo após a sua finalização em 1943:

A dissolução da Internacional Comunista é apropriada porque:

Expõe a mentira dos hitleristas de que “Moscou” pretende supostamente intervir na vida de outras nações e “bolchevizá-las”. A partir de agora é posto um fim a esta mentira.

Expõe a calúnia dos adversários do comunismo dentro do movimento trabalhista de que os partidos comunistas em vários países estão supostamente agindo não no interesse do seu povo, mas por ordens de fora. A partir de agora também se põe fim a esta calúnia.

Facilita o trabalho de patriotas de todos os países em unir as forças progressistas de seus respectivos países, independentemente de partido ou fé religiosa, num único campo de libertação nacional – para desencadear a luta contra o fascismo.

Facilita o trabalho dos patriotas de todos os países em unir todos os povos amantes da liberdade num único campo internacional para a luta contra a ameaça de dominação pelo hitlerismo, abrindo assim o caminho para a futura organização de um companheirismo de nações baseado em sua igualdade.

Além disso, as condições da Segunda Guerra para a União Soviética significavam intensas batalhas travadas principalmente na frente oriental. Os aliados se recusaram a atacar do oeste até que a Comintern fosse dissolvido.

No contexto internacional de alianças entre os campos capitalista e socialista, esse campo internacional contra o fascismo, levou muitos a acreditar que um novo mundo estava no horizonte. A perspectiva de ambos os campos trabalhando juntos para o benefício de todos era uma possibilidade aparentemente tangível. Muitas garantias de ambos os lados foram feitas sobre a ordem mundial do pós-guerra.

De fato, a coexistência pacífica não era uma ideia nova. Lenin também considerou isso não apenas como uma possível, mas como uma necessidade para construir o socialismo enquanto cercado pelo capitalismo. Isso porque uma revolução global ao mesmo tempo não era possível. Então, naturalmente, o socialismo emergiria em um país ou outro enquanto existia lado a lado com estados capitalistas. Então, como um assunto de política externa, a paz não era negociável, é um requisito de sobrevivência para o estado proletário até que o socialismo tenha cercado suficientemente o capitalismo.

Porém, nas condições da Frente Popular Antifascista, a ameaça do terror fascista provou ser uma preocupação muito mais premente e tornou o antagonismo entre os dois sistemas secundários enquanto existia o fascismo. Em 1947, Stalin explicou que “a diferença entre eles [capitalismo e socialismo] não é importante enquanto a cooperação for necessária. Os sistemas na Alemanha e nos Estados Unidos são os mesmos mas a guerra eclodiu entre eles. Os sistemas dos EUA e da URSS são diferentes mas nós não entramos em guerra um contra o outro e a URSS não se propõe a isso. Se durante a guerra podem cooperar, porque não podem hoje, em paz, dado o desejo de cooperar?”

A coexistência pacífica enquanto uma possibilidade prática foi construída portanto sobre as concessões do movimento comunista internacional para unir os dois campos contra o fascismo. E graças às aspirações progressivas das pessoas de ambos os campos em direção a um mundo pós-guerra, nenhum sacrifício era sagrado demais para prolongar a Frente Popular Antifascista, incluindo até a dissolução da Internacional Comunista. Assim, a linha comunista internacional foi definida na facilitação dos interesses nacionais para construir uma “unidade nacional”, em vez de um centro internacional para a revolução proletária.

Todavia o Partido Comunista da Grécia (KKE) repudiou firmemente o propósito antigo da dissolução do Comintern. A caracterização da guerra pelo Comintern como sendo inicialmente uma guerra imperialista para redividir o mercado mundial foi abruptamente alterada como sendo antifascista, uma vez que a Alemanha invadiu a URSS. O KKE argumenta que a verdadeiro caracterização da guerra como sendo imperialista era inevitavelmente uma parte e uma parcela das condições subjacentes da guerra, mas subestimada na a linha da Frente Popular Antifascista. O KKE explica no seu relatório sobre o Comintern pela Seção de Relações Internacionais do Comitê Central do KKE:

Esta posição subestimou o fato de que o caráter da guerra é determinado por qual classe trava a guerra e com que propósito, se está originalmente e naquele momento na defensiva ou na ofensiva. A luta contra o fascismo e a libertação da ocupação estrangeira, pelos direitos e liberdades democráticos, foi separada da luta contra o capital.

As contradições na linha da Internacional Comunista sobre o caráter da Segunda Guerra Mundial também foram influenciadas pelas aspirações da política externa da URSS e pela sua tentativa de se defender de uma guerra imperialista. No entanto, em todo caso, as necessidades da política externa de um estado socialista não pode suplantar a necessidade de uma estratégia revolucionária para todo país capitalista. A segurança em última instância de um estado socialista é determinada pela vitória do socialismo em âmbito global ou pela sua prevalência num grupo poderoso de países e logo pela luta revolucionária em cada país.

Além disso, a mudança na política dos partidos comunistas para essa nova realidade significava acabar com os métodos anteriores de trabalho usados antes da ascensão do fascismo. Para evitar um colapso do campo internacional, e sua tênue aliança, o papel do partido comunista era desviado da exposição das políticas opressivas da burguesia. O partido via essa agitação como uma ameaça que poderia culminar na entrega do capital progressista à reação.

Através desse contexto de unidade nacional, capitalismo progressista e coexistência pacífica, ocorreu a dissolução do Partido Comunista dos EUA e a seu reagrupamento na Communist Political Association [“Associação Política Comunista”, CPA] em 1944. Esta era uma organização não para a derrubada revolucionária da burguesia, mas para a “edificação Marxista” do povo americano que por meio da estrutura política burguesa existente no país iriam realizar o socialismo pacificamente em aliança com o capital monopolista progressista. O partido de novo tipo, o próprio leninismo, sendo finalmente rejeitado.

É muito fácil e conveniente atribuir todas as políticas incorretas do partido durante o período da guerra a Browder. Evidentemente ele foi o secretário geral do partido no período. O líder teórico do partido. Entretanto, isso cairia nas armadilhas mais fáceis para se analisar esse período. A Frente Popular, Unidade Nacional, Capital Progressista e Coexistência Pacífica não eram ideias somente do Browder. Isso tudo veio do movimento internacional e seus líderes. Da mesma forma, quase todos os partidos comunistas nos países de capitalismo avançado caíram em erros semelhantes.

Em última instância, não podemos ignorar a razão pela qual a Internacional Comunista foi dissolvida para manter as campanhas de unidade nacional dos partidos nos países de capitalismo avançado para ganhar apoio da burguesia contra o Eixo. Nem podemos ignorar o quanto a coexistência pacífica era considerada não apenas possível, como provável num mundo pós-guerra. Que atitudes hostis e interesses imperialistas se dissipariam na ausência da ameaça unificadora do fascismo não foi considerado a sério.

O que muitos chamam de Browderismo era na realidade então um fenômeno global de oportunismo de direita que se originou do imperialismo e dos seus efeitos nas políticas do movimento comunista internacional durante a guerra. Browderismo é apenas como se manifestou sob as condições dos EUA. Isso também explica por que todos os países capitalistas avançados foram vítimas de suas próprias variantes nacionais de browderismo. No entanto, em essência, pode-se dizer que surgiu em parte de uma oscilação ascendente nas condições, uma pausa no crescimento do movimento e da imaturidade política. Assim como a composição social dos partidos nos países capitalistas avançados. Claramente, do oportunismo.

Em virtude da nossa análise feita cerca de 80 anos depois das políticas de Frente Popular, algumas verdades são evidentes. Sendo assim, muitos partidos na ausência da Internacional Comunista caíram na social-democracia, o campo capitalista atacou e subverteu com veemência as Democracias Populares da Europa e, finalmente, participou da dissolução da URSS em 1991. A tão desejada coexistência pacífica, sua possibilidade técnica e necessidade histórica resultou apenas na perda da posição internacional do movimento comunista.

Talvez a aliança entre os campos capitalista e socialista só era possível através do interesse comum em destruir a ascensão do fascismo, e em última instância, em promover os interesses imperialistas. Stalin ainda qualificou essa aliança como sendo possível apenas se o ímpeto sustentado pela sua continuação no contexto de interesses comuns superando a contradição fundamental entre os Estados permanecesse intacto. Alianças entre os estados capitalistas baseiam-se na acumulação de forças para a redivisão de mercados, isso é indiscutível, as alianças entre democracias burguesas imperialistas e o socialismo são, como evidenciado pelo resultado prático da Segunda Guerra, baseadas na existência de uma ameaça tanto para as democracias burguesas como para o socialismo.

O “desejo”, por assim dizer, que condiciona a unidade entre os dois campos contra o fascismo deriva da própria natureza do fascismo. Sem essa ameaça, a dominação do imperialismo se torna o interesse primordial do campo capitalista, se não o for o tempo todo.

A lógica econômica do imperialismo necessita da guerra, requer a penetração de novos mercados. A paz entre os campos capitalista e socialista só pode, na melhor das hipóteses, ser tênue. Os capitalistas nunca deixarão de procurar pontos fracos no estado proletário para subjugá-los aos interesses do capital. A única maneira de manter a paz entre os campos é através de testes de força, caso contrário os capitalistas atacarão com força e destruirão o estado socialista. Lenin deixou muito claro que a coexistência pacífica era limitada e condicional:

A simples ideia de subordinar pacificamente os capitalistas à vontade da maioria dos explorados, da transição pacífica e reformista ao socialismo não é somente uma extrema estupidez filistina, mas também um completo engano dos trabalhadores, o embelezamento da escravidão assalariada capitalista, a ocultação da verdade.

De fato, todo o propósito da Internacional Comunista foi servir como um corpo organizador do proletariado mundial para combater o cerco da jovem República Soviética, a fortaleza do socialismo.

Em última análise, o Eixo foi derrotado, mas a um custo severo para o movimento comunista internacional que ainda hoje luta contra a reação fascista. Os fatores que contribuíram para a degradação dos partidos comunistas ocidentais estão situados em uma análise mais profunda das condições do capitalismo, retardando o desenvolvimento ideológico dos trabalhadores e, posteriormente, dos partidos comunistas.

Refletindo sobre o colapso da Segunda Internacional em 1972, Gus Hall observou:

A unidade entre os partidos foi diluída primeiro em uma unidade formal. Mas muito rapidamente até os vínculos formais se tornaram obstáculos para a realização de políticas oportunistas. Os laços mundiais e de classe entre os partidos se tornaram um constrangimento. Cada partido afirmou que seu internacionalismo seria expresso por meio de um trabalho efetivo, cada um dentro de cada uma das entidades nacionais.

Os líderes desses partidos socialistas rapidamente fizeram “novas” descobertas. Decidiram que Marx estava errado. Não havia leis de desenvolvimento capitalista que se aplicassem universalmente. Não havia conceitos mundiais de luta de classes. Em cada país, eles descobriam peculiaridades nacionais “fundamentais” que ofuscaram semelhanças internacionais. Os interesses da classe trabalhadora foram diluídos a ponto de não aparecerem em contradição com os interesses da classe dominante.

A luta de classes se tornou puramente uma “luta popular”. Os conceitos de classe tornaram-se conceitos nacionais. Nenhum partido condenava abertamente o internacionalismo, eles apenas colocavam na prateleira “por enquanto”.

Muitos dos partidos se tornaram enormes partidos de massa. Isso era bom. Mas o que não era bom, era que eles se tornaram partidos populares amplos ao seguirem os conceitos populares de nacionalismo e não de classes. Tornaram-se partidos de massa ao abrir mão de suas posições operárias avançadas. O seu crescimento foi alimentado pelo oportunismo.

Uma análise muito apropriada da Segunda Internacional que tem uma semelhança muito coincidente com as consequências objetivas do VII Congresso da linha do Comintern. O oportunismo está no centro de sua autodissolução.

Algumas implicações e consequências

Se a linha da Frente Popular do VII Congresso do Comintern for examinada até o seu final em 1943, é inquestionável que a sua tese principal constitui a base para vários líderes partidários mais tarde. Vamos esboçar essa conexão.

Como afirmado anteriormente, foi amplamente argumentado sob a linha do VII Congresso que os períodos anteriores do Comintern foram um erro e foram ultra-esquerdistas. O desenvolvimento e a popularidade do fascismo surgiram do “fracasso” do movimento comunista em ter se incorporado adequadamente nas grandes populações pequeno-burguesas e nacionalistas. A nova linha foi corrigir esse erro, afastando o movimento dos métodos “sectários de esquerda”.

Com efeito, um afastamento do combate ideológico à burguesia para formar a frente popular através de concessões a ela foi o desmantelamento sistemático do internacionalismo proletário. A “coexistência pacífica” como questão de política externa a partir de então para o movimento comunista perverteu-se para significar submissão total aos capitalistas que agora eram “progressistas”.

As “grandes massas” como definidas na linha do VII Congresso do Comintern não foram obrigadas por necessidade a se unir aos comunistas aqui [EUA] tanto quanto foi o caso na Europa devastada pela guerra. Enquanto os partidos comunistas ocidentais acabaram se transformando em social-democracia ao longo de várias décadas, o partido dos EUA o fez menos de dois anos após o VII Congresso. Ninguém pode negar a ameaça fascista que se agiganta nos EUA, mas o partido dos EUA foi destruído facilmente pelo oportunismo.

Novamente, já ressaltamos que Browder estava apenas aplicando a linha do VII Congresso do Comintern em seu fim lógico. Todos os entendimentos do browderismo, embora corretos superficialmente, são vazios quando examinados em um nível mais profundo. Browder foi muitas coisas, mas em última análise, seu fracasso deve ser encontrado principalmente em sua abordagem acrítica à linha do VII Congresso do Comintern. Devemos também mencionar que, embora Foster estivesse correto ao reconhecer a loucura do que estava sob a liderança de Browder, eles falharam em ver a sua conexão real com o VII Congresso do Comintern.

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