Por Bernard D’Mello*, via Montly Magazine, traduzido por Paulo Henrique Flores
Este ensaio é dedicado à memória de meu primeiro editor, o falecido Samar Sen (Shômor Babu, como costumávamos chama-lo), editor-fundador do semanário Frontier, de Kolkata.É também em homenagem a Subhas Aikat, cuja publicação Cornerstone, de Kharagpur, que mal consegue se sustentar, publica uma edição indiana da Monthly Review e livros que colocam o tipo de questões geralmente evitadas pela academia. O ensaio é meu pequeno agradecimento a todas as pessoas da Monthly Review, idas e presentes, em ocasião do seu 60º aniversário. Agradeço a Paresh Chattopadhyay, a N. Krishnaji, a John Mage, a C. Rammanohar Reddy e a P. A. Sebastian por seus comentários críticos, mas muito úteis, sobre um rascunho anterior; os avisos legais usuais se aplicam.
“[Um] marxismo sem sua essência revolucionária é uma contradição em termos, que não tem razão de existir nem forças para sobreviver.” – Paul M. Sweezy
Anuradha Ghandy (Anu, como a chamávamos) era uma dos membros do Comitê Central do Partido Comunista da Índia (Maoista) [CPI (Maoist) / PCI (Maoista)]. Desde o início, ela desenvolveu um sentimento de obrigação para com os pobres; ela se uniu a eles em suas lutas pelo pão, uma luta por uma vida mais rica e feliz para todos. Tragicamente, a malária a tirou de nós em Abril do ano passado. O que era esse espírito que fez com que ela adotasse de maneira generosa as lutas dos condenados da terra na Índia – a luta dos explorados, oprimidos, dominados – como se fosse a sua própria luta? Os riscos de se juntar à grande marcha maoista parecem muito perigosos para a maior parte das pessoas, mas não foram para ela, com seu jeito ousado, corajoso e decidido – e ainda assim gentil, acolhedor e atento. Talvez os dias dela estivessem contados, como estava listada nos arquivos dos aparelhos repressivos do Estado indiano como uma das mais procuradas “extremistas de esquerda”. Essa estrutura brutal e opressora tem conduzido uma estratégia de contrainsurgência extremamente violenta – pensada para manter a ordem estabelecida – contra o movimento maoista na Índia. O que está levando o Estado indiano a tentar desesperadamente destruir e prejudicar o espírito que inspira pessoas como Anu? Praticamente todo o regime indiano – do semifascista Partido Bharatiya Janata até a principal figura da esquerda eleitoral indiana, o Partido Comunista da Índia (Marxista) – se coloca contra o movimento maoista, apoiando uma imensa mobilização planejada de milícias paramilitares e policiais, com o apoio logístico dos militares, para acabar com os rebeldes. Parece que grupos do capitalismo monopolista – incluindo empresas como ArcelorMittal, o Grupo Essar, a Vedanta Recursos, Aços Tata, POSCO e o Grupo Jindal Sajjan – deram um ultimato aos governos estaduais e ao governo federal dizendo que irão abandonar seus projetos de mineração e industrialização se as resistências locais aos seus planos de negócios não for destruída de uma vez por todas.
A indignação “de direita” contra o “extremismo de esquerda” chegou a um ponto alto, alimentada por setores da mídia comercial, com imagens e perfis (oferecidos para a mídia por esquadrões antiterroristas) de revolucionários capturados como uma fonte de agitação para a audiência da TV. Um ano e meio atrás, meu filho – magro, desarrumado e com o cabelo bagunçado – chegou da escola um dia nos dizendo que o professor havia chamado ele de naxalita (é como popularmente os maoistas são chamados). Eu perguntei a ele, “Como você reagiu?”, e ele me respondeu “Papai, quem são esses caras, os naxalitas?”. Eu respondi “Bem, eles são rebeldes que lutam contra as grandes injustiças que são feitas contra os pobres.” Ele respondeu, “Bem, então eu me sinto orgulhoso de ser chamado de naxalita”. Meu garoto ainda é muito novo, mas ele logo vai chegar naquele maravilhoso momento na vida em que a necessidade de entender o que está acontecendo no país e no mundo não pode ser segurada. Mais recentemente, propagandas vingativas e mal intencionadas do Ministério Civil nos jornais chamavam os maoistas de “criminosos de sangue-frio”. Então, talvez seja o momento de eu pensar em como responder à pergunta do meu filho: o que é o maoismo?
Uma resposta para uma pergunta dessas exige que ela seja dada em partes, para respondermos antes a perguntas como: o que é o marxismo? O que é o leninismo? O que é o stalinismo? Só depois, então, poderemos entender qual é o sentido do maoismo. Porque, afinal de contas, o marxismo de Mao sem sombra de dúvidas vem da escola leninista; ele aplicou o marxismo, o leninismo (o pensamento marxista na fase do imperialismo) e o stalinismo (uma forma decomposta de leninismo, que ele também lutou para superar e ir além), como um método de análise da realidade social da China. Mas mais do que isso, ele fez uma intervenção na realidade chinesa com uma ação social e política consciente, guiada pela teoria marxista e, do final dos anos 1920 ao fim dos anos 1960, sempre em relação com os acontecimentos da sua realidade, tornando, assim, possível enriquecer a teoria original.
O que veio a ser conhecido como maoismo teve as suas origens materiais no subdesenvolvimento da China, nas práticas erradas do Partido Comunista Chinês (PCCh) nas áreas urbanas nos anos 1920 e no posterior movimento de camponeses e guerrilheiros nos campos do país. Teoricamente e na prática, o marxismo de Mao foi enriquecido ao superar e ir além da interpretação mecânica de Stalin da teoria da história de Marx. E Mao constantemente aplicou a “dialética materialista” de Marx para ajudá-lo a entender e resolver as várias contradições – conflitos internos que tendiam a dividir o que estava unido – em que o resultado saía das ações dessas tendências opostas uma sobre a outra. É a fusão de tudo isso com o marxismo e o leninismo originais que compõe o maoismo. Como o marxismo, na sua melhor parte, ele é uma visão de mundo, um método de análise e não um conjunto de dogmas. O que então significa o ditado maoista de “aprender a verdade a partir da prática”?
Com essa introdução, agora podemos ir adiante. Logo de início, me deixem dizer que ainda que eu fale só por mim mesmo, eu não tenho nenhuma pretensão de originalidade. Escrevi esse artigo como uma tentativa de esclarecer a mim mesmo e então o mandei para a publicação na esperança de que ele ajudasse outras pessoas como eu, tentando aprender sobre questões que não são acadêmicas.
O que é o marxismo?
Procurando responder essa pergunta, não posso fazer nada melhor do que o que a Monthly Review me ensinou. Nas palavras do editor-fundador:
“O marxismo é, acima de tudo, uma visão de mundo compreensiva, aquilo que os alemães chamam de uma Weltanschauung – ou seja, um conjunto de princípios filosóficos, econômicos, políticos, sociológicos e científicos, todos relacionados e formando juntos uma estrutura de pensamento autônoma e independente. Ele é um guia para a vida e a prática sociais, e a sua validade só pode ser avaliada pelos seus resultados”.[1]
Nessa visão de mundo, antes do capitalismo a civilização era impossível sem a exploração; a produção excedente apropriada era “concentrada nas mãos de poucos, de modo que o luxo, as riquezas e a civilização, por um lado, vinham sempre junto da pobreza, da miséria e da degradação, por outro”[2].
Foi em um mundo como esse que o capitalismo surgiu, incomparavelmente a sociedade mais produtiva e, nesse sentido, a mais progressista, que já havia surgido. De fato, pela primeira vez, ele tornou possível uma sociedade em que a exploração e a concentração de excedente nas mãos de poucos não era mais a condição necessária para a civilização.
Nesse momento, a humanidade encarava um problema completamente novo. Ela iria adiante, para uma nova forma de exploração superior e sem exploração, ou a exploração da maioria por uns poucos continuaria a ser a maneira de viver a vida?
Marx acreditava que o capitalismo nunca conseguiria usar as forças produtivas da sociedade para o bem dos operários, que ele pensava que estavam se tornando a maioria da população. Cedo ou tarde, os operários se tornariam conscientes de seus verdadeiros interesses como uma classe, se organizariam como uma força revolucionária poderosa, tomariam o poder dos capitalistas e começariam a transição para uma sociedade comunista em que a exploração e as classes seriam finalmente abolidas.
Não foi assim que as coisas aconteceram. Os operários nos países capitalistas mais desenvolvidos conseguiam ganhar o suficiente lutando no interior do sistema para evitar que desenvolvessem uma consciência revolucionária. Uma parte significativa desses ganhos era feita às custas dos países dependentes e explorados do Terceiro Mundo, que eram impedidos de usar os seus recursos para o seu próprio desenvolvimento independente. Como resultado disso, o centro da luta revolucionária se mudou das partes avançadas para as partes atrasadas do mundo capitalista.
Neste ponto, devemos dizer que se por um lado os marxistas compartilham uma concepção da realidade, eles se dividem em muitos aspectos na hora de explicar e analisar o mundo. Além disso, a estrutura intelectual criada pelos fundadores do marxismo – Marx e Engels – tem sido modificada e adaptada de maneiras significantes, e com certeza é assim que deve ser, com os avanços no conhecimento e no entendimento humanos e com o desenvolvimento do capitalismo em um sistema global. Mas, obviamente, a sua validade científica deve ser julgada em primeira instância por suas contribuições e sua habilidade de explicar a realidade.
No entanto, há uma exigência ainda maior – no longo prazo, o marxismo deve ser avaliado pelos resultados de seu projeto de levar a humanidade adiante no caminho da igualdade, da cooperação, da comunidade e da solidariedade. Deveríamos ter analisado este ponto antes, mas agora podemos focar nesse ponto crucial para o marxismo, um ponto que, seguindo Sweezy, sugerimos no início deste artigo. O objetivo de construir e reconstruir a sua estrutura intelectual própria para compreender o mundo foi e ainda é que essa atividade construa as bases para transformar a sociedade para melhor. É isso que Marx declara de maneira mais resumida nas Teses sobre Feuerbach, de 1845: “Os filósofos até agora apenas interpretaram o mundo, mas o que importa é transformá-lo”. Mas integrar a teoria e a prática (desenvolver uma estratégia e um conjunto de táticas para transformar o mundo para melhor e realizá-las) é um projeto bem mais difícil e trabalhoso.
Marx e Engels escreveram o Manifesto comunista em dezembro de 1847 e janeiro de 1848, mas nunca tentaram definir, menos ainda oferecer qualquer plano, para uma sociedade de transição (que os seus seguidores chamaram de socialismo) que com o tempo – era isso que se esperava – iria certamente evoluir para o comunismo. Como Sweezy disse, na concepção de Marx e Engels a sociedade de transição (“socialismo”) deveria começar a sua existência “primeiramente como uma negação do capitalismo, e se desenvolveria com a sua própria identidade positiva (comunismo) através de uma luta revolucionária em que o proletariado deve reconstruir a sociedade e, nesse processo, reconstruir a si mesmo”[3].
Mas, francamente, o proletariado dos países capitalistas desenvolvidos, por razões já mencionadas, estava cada vez mais perdendo a sua qualidade de força e de portador da prática revolucionária. O desenvolvimento da classe trabalhadora, o avanço da capacidade humana – sempre no centro das forças produtivas – não foi percebido pelos trabalhadores como estando limitado pelas relações de produção capitalistas; aliás, estas últimas não eram vistas como intoleráveis por parte dos trabalhadores enquanto eles conseguiam conquistar melhores condições de vida em suas lutas contra o capital feitas nos limites permitidos pelo sistema (greves, etc.). Por que os trabalhadores deveriam assumir o risco de perder tudo o que estavam ganhando no momento enquanto o que poderia ganhar com uma revolta contra o sistema era muito incerto e só viria em um futuro distante? Em outras palavras, Marx e Engels não culpavam os trabalhadores pela falta de uma consciência revolucionária; as condições objetivas não estavam lá para que ela se desenvolvesse.
O que dizer, então, do primeiro momento do marxismo (ele não era chamado de marxismo no tempo de Marx, mas o chamamos dessa maneira por facilidade) em relação à sua esperança equivocada (retirada principalmente da análise das condições de vida e trabalho da classe operária no livro de Engels A situação da classe trabalhadora na Inglaterra, escrito em 1844 e da lógica de Marx no famoso Prefácio de 1859 da Contribuição à crítica da economia política) de que a classe operária nos países capitalistas avançados mais cedo ou mais tarde iria se revoltar e se emancipar? As lutas – no início espontâneas e mais tarde organizadas – dos trabalhadores, lideradas pelos partidos de esquerda, eventualmente conseguiram forçar a classe dominante e seus representantes políticos a criar e implementar várias leis para as fábricas e para a sociedade, o que convenceu os trabalhadores de que as coisas poderiam melhorar nos limites do capitalismo. Nisso, sem dúvida, o lucro extraído dos trabalhadores nas colônias/neocolônias/semicolônias/países dependentes (a “periferia”), e que foi dividido não apenas entre as elites locais e as classes dominantes no “centro” mas também (em menor medida) entre as classes trabalhadoras do “centro”, ajudou a criar parte do amortecimento dos impactos do capitalismo. Como resultado disso, o capital no “centro” também se tornou mais forte mais rico.
Max e Engels não levaram todos esses desenvolvimentos em conta e, assim, se enganaram em suas expectativas de uma Europa socialista. Mas, para seu grande crédito, Marx analisou de maneira brilhante – além da expropriação em massa na Inglaterra com o cercamento dos campos – a pilhagem do capitalismo do que mais tarde seria chamado de “periferia” ou terceiro mundo durante o período do mercantilismo, na Parte VIII do volume 1 de O capital, que tem o título de “A assim chamada acumulação primitiva”. Marx também não ignorou a “troca desigual”, que sugava uma parte do lucro criado na produção através de financiamentos usados pela classe dominante para o comércio de mercadorias (capital mercantil), entre o centro e a periferia na fase competitiva do capitalismo. Basicamente, o capital mercantil teve um papel crucial na periferia, ainda que ele fosse um apêndice do capital industrial no centro[4]. Marx não teve a oportunidade de reorientar sua teoria da acumulação para levar em conta o que havia acabado de começar no fim da sua vida, o surgimento do capitalismo como um sistema global e com a aceleração do capitalismo monopolista mundial. Mas sabemos, segundo Sweezy[5], que ele estava atento da relação causal entre o desenvolvimento do capitalismo e o “centro” na Europa e o desenvolvimento do subdesenvolvimento da “periferia”. O primeiro período do marxismo, no entanto, se mostrou inadequado para elaborar uma teoria da acumulação em escala mundial que explicasse o funcionamento do capitalismo como um sistema global. De todo modo, Marx criou um método de analisar o capitalismo – analisar como o capital consegue as suas riquezas através da pilhagem da “periferia”, da expropriação pelos cercamentos (privatização), da mais-valia dos trabalhadores e da aquisição de unidades menores e mais fracas de capital; analisar como a superestrutura (o Estado, o sistema legal, a ideologia dominante e a cultura) é adaptada e modificada para facilitar isso tudo e com que potenciais. Esse método era o “materialismo histórico”, que foi aplicado pelos melhores de seus seguidores – dois dos quais foram Lenin e Mao – para compreender um mundo que sempre está em transformação e para intervir nele com o objetivo de transformá-lo.
Enquanto isso, os partidos que lideravam os vários movimentos da classe trabalhadora na Europa, membros da Segunda Internacional, continuaram a defender da boca para fora a causa da revolução proletária. Mas logo eles foram expostos como o que eram na realidade, quando, em 1914, eles apoiaram seus governos nacionais na Primeira Guerra Mundial, uma atitude que demonstrava nada mais, nada menos do que a destruição do internacionalismo dos trabalhadores e de muitas esperanças de revoluções proletárias. Com a possibilidade de que os trabalhadores fizessem ganhos econômicos, sociais e políticos suficientes nos limites do capitalismo nos países do “centro”, o marxismo foi “revisado”, deformado por Eduard Bernstein e outros para que ele fosse esvaziado de seu conteúdo revolucionário. Obviamente, isso não era mais marxismo, mas nas condições objetivas da Europa essa teoria “revisionista” tomou o lugar da teoria revolucionária de Marx.
O que é o leninismo? O que é o stalinismo?
Foi nesses tempos ruins que Lênin, um marxista consistentemente ortodoxo, tocou em um ponto central na estratégia política com seu texto Imperialismo: o último estado do capitalismo (1916), explicando a guerra que então acontecia em termos de uma divisão do mundo em diferentes esferas de influência nas lutas entre capitalistas para uma redistribuição destas esferas. O objetivo de Lênin se limitava principalmente a explicar a natureza da guerra que acontecia no momento e o que deveria ser feito pelos socialistas que dirigiam a classe trabalhadora. Lênin insistia em que mais do que combater e matar uns aos outros nessa guerra imperialista, os trabalhadores deveria ser convencidos a converter a guerra imperialista em uma guerra civil para derrubar as suas respectivas burguesias. O impacto da acumulação em escala mundial na formação do “subdesenvolvimento” da “periferia” e, em contrapartida, a acumulação de capital no “centro” – assim como a consciência da classe trabalhadora ali – não eram o foco.
Ao invés disso, na visão de Lênin, os super-lucros do capital monopolista eram, entre outras coisas, usados para comprar uma camada superior da classe trabalhadora – criando assim uma “aristocracia” do trabalho – e alguns líderes dos movimentos de classe. Assim, Lênin acusava as lideranças políticas dos partidos social-democratas que lideravam os movimentos de suas respectivas classe trabalhadoras e a sua traição da maioria de seus proletariados nacionais. O fato de que as condições objetivas da Europa haviam mudado, o que atrasou a difusão da consciência revolucionária pelos trabalhadores no continente, o atordoava. Mas devemos dizer – em geral – sobre Lênin e os bolcheviques que ao longo da sua prática eles resgataram o marxismo dos seus defensores que, de maneira errada e mecânica, interpretavam Marx como um “determinista histórico”.
Tenho que explicar aqui a posição marxista. Uma maneira “determinista” de pensar diz que a história e as condições dadas que existem em um local determinam exclusivamente o que vai acontecer no futuro. No outro extremo, um ponto de vista “voluntarista” defende que quase tudo pode acontecer se for modificado pela vontade e pela determinação firme de líderes eficazes e do forte apoio que recebem de seus seguidores. Na minha perspectiva, o marxismo não é nem “determinista”, nem “voluntarista” – na sua concepção, em um dado momento, existe um conjunto de possibilidades, determinado tanto pela história quanto pelas condições e o contexto do momento. O resultado final desse conjunto de possibilidades depende da atividade social. Ou seja, de qual for o objetivo intermediário que os líderes escolherem nesse conjunto de possibilidades (“estratégia”) e dependendo de se os seus apoiadores vão decidir tentar atingir este objetivo com as táticas adequadas e se vão responder “corretamente” ao curso dos acontecimentos que vão se desenvolver. Claramente, Lênin – e Stalin, e Trotsky, poderíamos acrescentar – colocou muito peso nos problemas da liderança – a direção centralizada de uma vanguarda revolucionária. Mao não discordava disso, mas a partir da experiência ele deu importância à necessidade de uma relação mútua honesta e correta entre a base do partido e as massas.
Stalin chamou o leninismo de “o marxismo da era do imperialismo” e “ditadura do proletariado”. Mas ele traz um sentimento de angústia para muitos socialistas. Por um lado, ele era o único entre os líderes bolcheviques que veio do meio dos condenados da terra (seu pai era um sapateiro pobre e sua mãe era de uma família de camponeses pobres), com a sorte de ter sido educado em um seminário religioso; foi com a sua liderança que a União Soviética e o seu Exército Vermelho venceram a potência das forças armadas da Alemanha na Segunda Guerra Mundial, protegendo a humanidade do fascismo. E enquanto Stalin viveu foi possível acreditar (de maneira errada, para alguns) na existência de um movimento mundial coordenado que estava em um conflito revolucionário com o capitalismo e o imperialismo. Mas, por outro lado, ele entregou o leninismo e o socialismo à morte – o que não é democrático, nunca pode ser socialista. De fato, como Harry Braverman[6] coloca:
“A destruição do antigo Partido Bolchevique fechou inúmeras possibilidades para a União Soviética, e é difícil imaginar todas elas. [E ele acrescenta em uma nota,] Stalin não parou com a aniquilação das oposições de esquerda e direita, dirigidas respectivamente por Trotsky e Bukharin. Ele se voltou contra seu próprio grupo, e, como Kruschev disse no XX Congresso, executou 98 de 139 (70%) do Comitê Central selecionado para o XVII Congresso em 1934.”
Além disso, penso que deveríamos levar em conta o que foi chamado de “o último combate de Lênin” – um combate para avisar do grave perigo do crescimento de uma burocracia dominante e da “brutalidade” de Stalin. Além disso, me parece, e passei a acreditar nisso, que dada a existência de classes, do patriarcado, do racismo (e das castas, poderíamos acrescentar) por milênios, o poder e a obsessão estão profundamente enraizados na realidade social; de fato, eles já se tornaram parte da condição humana herdade (mas não imutável), o que leva a defender de maneira bastante forte direitos civis liberdades e democráticas (e essas coisas foram conquistadas com lutas históricas dos de baixo) que não deveríamos permitir que fossem retirados de maneira nenhuma.
Para o nosso objetivo nesse texto, no entanto, seria pertinente mencionar brevemente a maneira de pensar de Lênin sobre a revolução na Rússia capitalistas “atrasada” em que, na sua análise, a burguesia e os seus representantes políticos eram incapazes de realizar uma “revolução democrático-burguesa” – derrubando o czarismo e confiscando e distribuindo as terras dos senhores feudais – fazendo com que fosse uma necessidade absoluta que a classe operária, em aliança com os camponeses, assumisse essa tarefa, mas apenas para se mover adiante para a próxima fase, a da revolução socialista. Em tudo isso, a aliança operária e camponesa deveria ser dirigida pelo partido de vanguarda. A concepção que Lênin tinha de um partido desse tipo se tornou clássica – o seu objetivo era organizar politicamente e levar ideias revolucionárias à classe trabalhadora e, mais geralmente, às massas, e liderar a revolução para construir uma “ditadura do proletariado”. Marx já havia pensado a ditadura do proletariado como um sistema em que, logo depois da tomada do poder, esse seria o regime em que o proletariado iria “não apenas exercer o tipo de hegemonia exercido até aqui pela burguesia”, mas uma “forma de governo em que a classe trabalhadora realmente governa, realizando muitas das tarefas que até aqui cabiam ao Estado”, e Lênin assumia integralmente essa perspectiva[7]. Obviamente, no pensamento de Lênin a ditadura do proletariado deveria ser exercida pelos trabalhadores sob a direção do partido de vanguarda. Este último se desenvolveu ao longo do tempo – nas condições exigidas pela ilegalidade, a organização no interior do partido era diferente em 1902 da que surgiu depois de 1905, e em fevereiro de 1917, quando um partido de massas defendendo o “centralismo democrático” foi percebido como o necessário. O centralismo democrático foi pensado como um princípio organizativo para o interior do partido em que os vários grupos dentro do partido deveriam aderir estritamente à orientação de “liberdade de discussão, unidade de ação. Ao final, o que aconteceu na prática foi a subordinação do elemento democrático; em 1921, as tendências internas foram virtualmente proibidas, uma coisa da qual se diz que Stalin tirou vantagem para conquistar sua dominação no partido. Em paralelo, a ditadura do proletariado – concebida como uma ditadura sobre as antigas classes dominantes, mas um modelo democrático no que dizia respeito às massas – passou a ser ”amplamente associada com a ditadura do partido e do Estado sobre toda a sociedade, incluindo o proletariado[8], o que foi associado com o stalinismo.
O stalinismo – uma versão decomposta do leninismo, associada intimamente com o regime na União Soviética desde o final dos anos 20 ao momento da morte de Stalin em 1953 – tem que ser visto, como Ralph Miliband corretamente enfatizava, no contexto da história russa. No entanto, dados os limites da brevidade, podemos na melhor das hipóteses apenas listar as suas principais características, baseados em grande parte – mas não de maneira acrítica – em Miliband[9]:
- a perspectiva de que é possível construir o “socialismo em um só país”;
- a opinião de que no socialismo deve haver um Estado bastante forte;
- a visão de que a luta de classes se intensifica com o avanço do socialismo;
- o culto da personalidade, com um foco obsessivo na vontade do líder supremo;
- coletivização forçada e industrialização acelerada;
- supressão agressiva dos dissidentes, da inteligência crítica e da discussão livre no interior do partido;
- os expurgos e julgamentos “políticos”, e a exclusão da maior parte das figuras importantes da revolução bolchevique
- os campos de trabalho forçado, em que milhares de pessoas ruins passaram por grande miséria
- a oposição ao fascismo e a contribuição decisiva à vitória aliada contra ele;
- o descrédito do marxismo-leninismo por uma interpretação mecânica dele e a sua formulação como ideologia de Estado oficial para legitimar o poder das elites;
Apesar disso, tudo indica que as expectativas e as visões de Lênin quanto a um Estado socialista – tal como dito em O Estado e a Revolução, escrito no verão de 1917 – depois da tomada do poder foi inspirado pelo elogio da Comuna de Paris de 1871 por Marx, retirando dela lições sobre o futuro “Estado” socialista. Marx foi enfático quanto ao fato de que a classe trabalhadora, depois de tomar o poder, não deveria simplesmente assumir o controle da estrutura existente, das instituições e da maquinaria do velho Estado, que deveria ser completamente “destruída” e substituída por um Estado de tipo radicalmente novo. Como Miliband coloca[10] a descrição de Marx da fórmula da Comuna, que mais tarde Lênin parece ter aceitado, e o papel do partido imaginado por ele em O Estado e a Revolução:
“[Todos os oficiais] deveriam ser eleitos, estariam subordinados à revogação em qualquer momento e o seu salário seria fixado no nível do salário dos operários. Instituições representativas seriam mantidas, mas os representantes seriam controlados de perto e constantemente por seus eleitores e submetidos à possibilidade de revogação. Com efeito, a maioria proletária não deveria apenas dominar, mas de fato governar em um regime que chegaria a exercer um poder popular semi-direto.”
Um traço muito importante de O Estado e a Revolução, dada a importância que Lênin sempre atribuiu ao papel do partido, é o papel bastante subsidiário que é atribuído a ele nessa instância.
Mas a visão de Lênin de um Estado socialista “não sobreviveu à tomada do poder pelos bolcheviques”. Ainda assim, ele “nunca renunciou formalmente às perspectivas que haviam inspirado O Estado e a Revolução”. Podemos, assim, concluir que Lênin queria a “criação de uma sociedade na qual o Estado seria estritamente subordinado ao poder e ao autogoverno no povo”[11]? O contraste entre a teoria e a prática, nesse caso, não poderia ter sido mais claro. Francamente, temos que distinguir entre o que se diz e o que se faz. Afinal de contas, o que aconteceu no Congresso dos Sovietes – sovietes que tinham o potencial para ser os órgãos de autogoverno dos operários e camponeses – que surgiram quase espontaneamente no movimento de Fevereiro de 1917? Ao fim do verão de 1918, os sovietes não tinham muito mais do que uma existência formal. A principal instituição da ditadura do proletariado, os Sovietes de Deputados Operários e Soldados (independente de qualquer partido), assumiu o banco de trás, com a liderança do partido no volante[12]. De fato, a ditadura do proletariado foi julgada como sendo impossível a não ser pela direção de um partido único; o pluralismo socialista também foi preterido. Mas, para sermos honestos, é importante notas que Lênin, em seus últimos escritos, expressou a necessidade de criar as bases para o autogoverno popular, pelos quais, ele sentia, deveria ser desenvolvida uma revolução verdadeira em que a cultura florescesse entre o povo. Ele, neste momento, falava a favor de uma “revolução cultural”, coisa que Mao desenvolveu na China em 1966 com o objetivo de “evitar a restauração capitalista”[13]?
Maoismo: Evolução e desenvolvimento
Milênios são muito longos. Disputemos sobre manhãs e tardes.
– Mao Zedong, 1963
O senso comum do dia apresenta Mao como uma espécie de “monstro”, por exemplo no livro de 2005 de Jung Chang e Jon Halliday, Mao a história desconhecida, que em uma tentativa obcecada de rebaixar Mao, está bem menos preocupado com os fatos conhecidos sobre o homem (ver o livro de Mobo Gao, capítulos 4 e 5[14]). De fato, em A vida privada do Presidente Mao de Li Zhisui, ele é apresentado como um “devasso monstruoso” por um médico que tem como objetivo difamar Mao, vergonhosamente distorcendo os fatos[15]. É evidente que está acontecendo uma “batalha pelo passado da China”, com os intelectuais das elites liderando o ataque. Estes são chineses que foram vítimas, reais ou imaginárias, diretas ou indiretas, da Revolução Cultural, e alguns são as referências mais importantes no campo dos “Estudos Chineses” pelo mundo, que sempre tiveram a tendência de mudar de orientação dependendo da direção dos ventos políticos em Washington. Por exemplo, as suas posições mudaram de “depreciativas” durante o período de hostilidade da Guerra Fria, para “contrariadamente complementares” depois da tranquilidade China-EUA no início dos anos 1970, e depois para “Mao estava completamente errado; a culpa é de Mao” com o grande retrocesso na China no período pós-Mao, quando a visão oficial se tornou anti-maoista e a ideologia neoliberal passou a dominar.
A cartilha da objetividade que é repetidamente invocada é um mito. Não é surpreendente que em um mundo em que “as ideias da classe dominante em cada época são as ideias dominantes”, a visão daqueles que foram beneficiados pela Revolução Cultural, os camponeses e operários — que ganharam em termos de educação, serviços de saúde e outros aspectos do bem-estar social, e também com a “voz” que conquistaram nos campos, nas fábricas e na arena política – não estão sendo ouvidas[16].
Com essa pontuação necessária para o lado ao qual eu tendo, quero chegar às origens do maoismo, que conquistou espaço na vida com o resultado imediato da rejeição da linha desastrosa de uma “frente única feita de dentro” (levando a limitações à independência organizativa, que foi literalmente imposta ao PCCh (Partido Comunista da China) pela Terceira Internacional (a Comintern) em 1923. Essa última afirmou que o Kuomintang (KMT), liderado por Chiang Kai-shek (desde a morte de Sun Yat-sen em 1925), representava a “burguesia nacional revolucionária” da China. Essa aliança supostamente produziria uma libertação nacional uma revolução democrático-burguesa (revolução liderada pela burguesia em aliança com camponeses e operários), mas só levou a uma derrota desastrosa para os comunistas nas mãos da contrarrevolução de Chiang em 1927, levando à uma guerra civil (1928-35).
Mas até na derrota houve um lado positivo: sem dúvidas, o KMT liderado por Chiang controlava a parte principal das forças armadas; mas o Quarto Exército desertou em agosto de 1927 para se juntar aos comunistas, o que levou à fundação do Exército Vermelho. A nova liderança do PCCh gradualmente começou a se consolidar em torno de Mao; no entanto, foi só por volta de 1932 que essa florescente autoridade “maoista” ganhou legitimidade e que o PCCh formulou, e refinou com o tempo, sua própria estratégia e caminho para conquista os objetivos da “nova revolução democrática” (NRD).
Para o nosso objetivo aqui, temos que mencionar que a Comintern tinha estendido mecanicamente a análise histórica de Marx da transição do feudalismo ao capitalismo na Europa para as colônias/semicolônias/neocolônias, só acrescentando que nelas o imperialismo havia se aliado aos feudalistas para consolidar seu poder. Se assumia como pressuposto que a burguesia nacional assumiria a liderança na luta contra o imperialismo e o feudalismo/semifeudalismo, e que portanto era dever dos comunistas nessas regiões agrupar as massas para apoiar este projeto, porque ele levaria à independência nacional e à democracia burguesa, sem as quais a luta pelo socialismo teria que ser indefinidamente adiada. Mas, como vimos, essa política levou a uma derrota desastrosa dos comunistas na China em 1927. A chamada burguesia nacional provou não ser nada além de uma aliada do imperialismo contra os comunistas.
Foi o PCCh, com Mao, que desafiou mais efetivamente a linha da Comintern se recusando a entregar o controle e a liderança àqueles com quem não se poderia contar para levar até o fim a luta por uma verdadeira independência nacional ou a luta contra o feudalismo/semifeudalismo. A qualidade da liderança era especialmente importante[17]. Ela adotou a estratégia de uma guerra popular prolongada (GPP), que se apoiava nos camponeses, construindo áreas de base, e entrega “a terra para quem a cultiva” além de promover outras políticas sociais (por exemplo, lidar com a questão de gênero pela mobilização das mulheres camponeses) nessas áreas (governadas democraticamente como governos autônomos independentes), construindo assim uma base política de massas no campo para, no fim, cercar e capturar as cidades.
Aqui, temos que enfatizar que foi apenas durante a resistência anti-japonesa (1937-45), quando a contradição entre o imperialismo japonês e a independência nacional se tornou a principal (assumindo o papel dominante), empurrando a luta entre o feudalismo e as massas para uma posição secundária e subordinada, que o PCCh conseguiu mudar progressivamente a opinião nacionalista em seu favor. Foi nesse período que ele superou o seu isolamento nas áreas rurais para passar a uma fase nacional, estendendo a GPP e conquistando a imaginação popular. O PCCh não teria tido sucesso em capturar as cidades sem uma mobilização nacionalista de massas ao longo da resistência anti-japonesa, que se voltou de maneira decisiva a seu favor em função do seu manejo correto da unidade e da luta entre nacionalismo e anti-imperialismo, levando ao sucesso e à realização da NRD.
No núcleo da NRD estava a oposição à transformação da sociedade sob a liderança da burguesia e de seus representantes políticos. A NRD – sem dúvidas liderada pelo PCCh – suprimiu a grande burguesia porque, ainda que ela tenha mantido empresas capitalistas privadas, ela significava principalmente criar as condições para o socialismo.
No coração do caminho da NRD, de 1927 a 1949, estava a construção de áreas de base que envolviam[18]: 1. conquistar a vitória na luta política, estabelecendo assim as bases para gerir um governo em miniatura na área de base; 2. vencer na luta econômica – terra para quem trabalha nela, investigação da condição das terras, incentivo à ajuda mútua e à cooperação, e conseguir o desenvolvimento das forças produtivas (os meios materiais de produção e capacidades humanas) na agricultura e na indústria leve; e 3. continuar a luta cultural e ideológica, com um grande nível de conexão entre as três.
Tudo isso – seja político, econômico, ou cultural e ideológico – exigia que fosse seguida a “linha de massas”, um traço característico do maoismo. Ela é um método de envolver as massas em como, por exemplo, cada uma das tarefas acima deve ser executada, e então implementar o que foi decidido com a participação das massas. Os líderes do partido, com isso, entendiam corretamente as opiniões do povo e assim elaboravam as políticas exigidas de uma maneira que as massas iriam apoiar e ativamente implementar. Mao resumiu esse ponto de maneira breve como “das massas, para as massas”. De fato, no processo de participar da “terra para quem trabalha nela”, da investigação da terra, das lutas ideológicas, o povo compreendia a estrutura de classe local e as ideias e instituições que sustentavam a ordem estabelecida[19].
Isso nos traz às três dimensões centrais da teoria e da prática maoistas em sua tentativa de enriquecer o processo democrático no partido de vanguarda leninista, nas organizações de massas e na sociedade. Na concepção maoista do partido de vanguarda, assim como na de Lênin, a direção centralizada de uma vanguarda revolucionária é central, e essa liderança é composta de intelectuais, operários e camponeses, com a diferença de que se deve buscar que operários e camponeses, ao longo do tempo, seja representados em maior proporção. O que, no entanto, é característico do esforço consciente de Mao para fundir o princípio organizativo intrapartidário do centralismo democrático (“liberdade de discussão, unidade de ação”) com a linha de massas (“das massas, para as massas”), são as organizações de massa sob a direção do partido estabelecendo a ligação crucial entre os dois. Talvez devamos dar aqui uma palavra a respeito da afirmação do partido de vanguarda liderado pelo proletariado. Aqui, como Benjamin Schwartz[20] explica, no maoismo o termo “proletário” se refere também a um conjunto de qualidades éticas – “autocontrole, sacrifício ilimitado às necessidades da coletividade, autoconfiança guerrilheira, energia incansável, disciplina de ferro, etc.” – como norma de um comportamento coletivista. A liderança proletária, então, é constituída de intelectuais, operários e camponeses que se superam nessas exigências morais.
Estamos, assim, começando a compreender algumas das características próprias do maoismo – a concepção da NRD, em oposição à revolução democrático-burguesa; GPP; “áreas de base” e a maneira pela qual são estabelecidas; a contradição principal (que pode mudar com o tempo) como a que deve orientar a trajetória da GPP; o centralismo democrático mais a linha de massas. Agora, então, é o momento de introduzir o que pode até ser a diferença específica do maoismo, o que pode ser feito de modo melhor ilustrando a prática maoista na China. Já indicamos a ideia de que o caminho para o socialismo na China já havia sido iniciado e as lutas para persistir nesse caminho se iniciaram logo no início da fase democrática da própria revolução. Dissemos que a grande burguesia foi suprimida durante a NRD para estabelecer as pré-condições para o socialismo. Por que?
Os socialistas, mais do que outras pessoas, sabem bem que existem limites claros para a compatibilidade de capitalismo e democracia, pelo menos se esta última for entendida como um governo de acordo com o desejo do povo[21]. Mas de um ponto de vista capitalista, uma democracia desse tipo é aceitável e considerada viável apenas se a maioria continuar a acreditar que o sistema capitalista é o melhor de todos ou que não existe alternativa além de viver nele. No momento em que essa crença se decompõe, a democracia se torna um perigo em potencial para o capitalismo, o que é melhor ilustrado para o caso do Chile em 1970, logo depois da vitória e da posse de um partido que afirmava estar decidido a começar a transição para o socialismo, enquanto a grande burguesia colaborava com Washington e os militares assumiram para salvar o capitalismo[22]. Para bloquear essa possibilidade, um novo tipo de democracia (“nova democracia”) tem que ser criado, um tipo que não impeça a transição ao socialismo se a maioria o quiser, e pelo qual a grande burguesia tem que ser suprimida. Com efeito, a NRD não supera o capitalismo, mas confisca a propriedade dos imperialistas e da grande burguesia – aqueles que estão no topo da riqueza, do poder e do privilégio – e com isso destrói a oposição antidemocrática a socialismo com seus representantes e apoiadores.
Mas temos que avançar na compreensão da ideia maoista de passos no interior da nova fase democrática, passos na transição ao socialismo e passos no interior do próprio socialismo, e na compreensão de que as pré-condições para um passo/fase posterior no processo de transformação devem ser criadas no interior do passo/fase anterior. O programa de reforma agrária que levou passo a passo para as comunas pode ser usado como uma ilustração importante. Será melhor partirmos dos livros de William Hinton, Fanshen: A Documentary of Revolution in a Chinese Village (1966) e Shenfan: The Continuing Revolution in a Chinese Village (1983), que juntos oferecem um testemunho ricamente documentado da reforma agrária na vila Arco Longo da província de Shanxi durante 1946-48, levando à formação de equipes de ajuda mútua e, a partir de 1953, o agrupamento destas equipes em “cooperativas básicas”, e daí em diante em cooperativas avançadas e depois em comunas, detalhando estes desenvolvimentos até 1971. Os livros relatam muitos fatos, inclusive alguns que contradizem a posição do autor, mas é difícil propor outro quadro interpretativo para avaliar todos esses acontecimentos sociais. No entanto, afortunadamente, depois disso Hinton ajudou a elaborar um quadro interpretativo desse tipo[23], ainda que ele também tenha revisto a sua posição sobre a Revolução Cultural depois da da publicação de Shenfan[24]. Talvez fosse melhor começarmos no ponto em que Fanshen se conclui: “A reforma agrária, criando igualdade básica entre os produtores rurais, apenas apresentou os produtores com uma escolha entre caminhos diferentes: a propriedade privada da terra, que leva ao capitalismo, ou a propriedade coletiva que leva ao socialismo.”
O livro, no entanto, realmente nos faz pensar e não posso evitar colocar esses pensamentos. Como se sabe, a primeira narrativa de Hinton sobre Arco Longo nos oferece um “microcosmo” das movimentações que derrubaram o semifeudalismo no interior da China. Por um lado, ele esclarece o que um camponês pobre tem que passar em um ano ruim e como ele ou ela se sentem quando não há excedente para pagar os impostos, os juros e amortizações, e também como ele ou ela têm que entregar os grãos que teriam mantido para salvar suas famílias da fome, e sabem que o mesmo senhor de terras e/ou agiota e comerciante colaboraram com a invasão japonesa em 1937-45. Por outro lado, podemos entender como se desenvolveu um laço profundo entre o camponês pobre e o quadro de base do partido quando o camponês sabe que o quadro se considera responsabilizável diante da liga de camponeses pobres e do congresso do povoado.
Há mais uma percepção importante que podemos tirar de Fanshen – a de que quando se extrai renda e juros, e o que é perdido na “troca desigual” da produção líquida da unidade produtiva de uma família de camponeses pobres, especialmente em um ano ruim, o que sobre é ainda menos do que um trabalho assalariado teria pago, ou seja, se alguém fosse atribuir os salários respectivos para o trabalho familiar dos camponeses. Isso sugere uma exploração em um grau ainda maior sob o semifeudalismo do que sob o capitalismo atrasado, ainda que ambos estejam no mesmo nível tecnológico. Marx também se referiu a isso, ainda que em um contexto diferente, quando discutiu a exploração dos camponeses irlandeses.
Isso nos coloca em oposição aos estudiosos, incluindo Benjamin Schwartz[25] que sustentam que o PCCh, ainda que tenha conseguido chegar ao poder essencialmente pela força de sua organização entre os camponeses, e não do proletariado urbano, inaugurou na China a “decomposição” do marxismo que Lênin começou na Rússia, e assim, é o oposto da inovação importante que alguns atribuem a ele. Dadas as indicações de Marx sobre os camponeses irlandeses, duvido que teria concordado com essa perspectiva.
Vamos prosseguir, então, para Shenfan. No próprio ano de 1948, os camponeses haviam começado a formas equipes de ajuda mútua em que um pequeno número de unidades domésticas compartilhava recursos que não a terra (ferramentas, melhorias do solo, planejamento, e ocasionalmente trabalho), mas ainda cultivava a terra em uma base individual. Então, em 1953, a formação de cooperativas elementares se desenvolveu, nas quais a terra, assim como os outros recursos, era compartilhada, mas os direitos de propriedade individuais eram mantidos. Os ganhos eram baseados parcialmente na propriedade e parcialmente no tempo de trabalho dedicado à produção cooperativa em proporções estabelecidas de maneira a ganhar a maioria do apoio da população local. Aqui, os lucros tinham que ser pagos baseado nas posses, incluindo a terra, que eram disponibilizadas pelos camponeses, mas as queixas dos camponeses médios e ricos eram de que esses lucros não eram tão grandes quanto os que eles teriam se as coisas não fossem assim, ou seja, se eles tivessem cultivado a sua propriedade individual contratando trabalho de outros. Mas quando a colheita começou a aumentar em função do uso mais intensivo do trabalho na modalidade cooperativa, o conflito sobre como dividir os lucros entre o trabalho contribuído e a propriedade se tornou mais forte[26]. A resolução geralmente assumiu a forma de um deslocamento de uma divisão de trabalho ao capital de 40/60 a uma de 60/40, já que, com o tempo, era o trabalho vivo que criava o excedente em relação às propriedades. Chegaria então um tempo em que os excedentes criados pelo trabalho excederiam em muito as posses originais compartilhadas no momento da formação das cooperativas, quando se tornaria possível abolir a parte do capital no luco líquido, ou seja, para que se avançasse em direção às “cooperativa avançadas”.
Estas significavam um avanço socialista definitivo, implicando em que todas as unidades domésticas camponesas nestas cooperativas de produção, com a propriedade comum dos recursos produtivos. Como Hinton[27] coloca: “Quando o novo capital criado pelo trabalho vivo ultrapassa e finalmente domina o antigo capital com o qual o grupo começou, então o lucro dos antigos investidores e seus pagamentos desproporcionais se tornam exploração, uma transferência de riqueza daqueles que a criaram pelo trabalho duro para aqueles que têm a propriedade dos investimentos originais e podem, normalmente, não trabalhar”.
É claro que, com mais um passo adiante no caminho da coletivização, as cooperativas avançadas foram transformadas em unidades maiores de economia e governo coletivos – as comunas. O ponto, no entanto, é que em cada passo no caminho para a coletivização as pré-condições para o próximo passo foram estabelecidas e ajudaram a resolver as antigas contradições, tornando mais fácil a transição para o próximo passo.
Mas, costuma ser dito, a estratégia no Grande Salto Adiante (GSA) (1958-61), a organização das comunas populares e os desvios de esquerda desse período levaram a uma fome massiva em que se diz que 30 milhões de pessoas morreram (números contestados por Utsa Patnaik[28] e Joseph Ball[29]). E, além disso, teriam acontecido a violência e as tragédias pessoais excessivas da Revolução Cultural (RC). Por ambas as tragédias, Mao e o maoismo foram apontados como sendo inteiramente responsáveis. Hinton, no entanto, discorda. Para chegar à verdade, ele explica o contexto – o de uma “guerra política prolongada”[30]. A NRD foi uma revolução de novo tipo, nova porque ela deveria criar as pré-condições para uma via socialista, ao contrário das revoluções democrático-burguesas que abriram o caminho para o capitalismo. Depois de 1949, no entanto, a resolução das contradições com o semifeudalismo e o imperialismo levou a contradição entre o capitalismo e o povo trabalhador chinês para a posição dianteira – e esta se tornou a contradição principal. Desde o momento do começo da NRD, o PCCh se dividiu em duas tendências majoritárias – uma “proletária”, dirigida por Mao, e uma “burguesa”, dirigida por Liu Shaoqi e Deng Xiaoping; antes da libertação a tendência maoista tinha bases nas áreas liberadas e a outra nas cidades controladas pelo KMT. Depois da libertação de 1949, as duas tendências “se fundiram organizativamente, mas nunca se fundiram ideologicamente”[31]. Isso levou a uma divisão fundamental no que dizia respeito à da estratégia de desenvolvimento e da política desde que Mao conduziu a China em uma via decisivamente socialista. Foi na véspera do GSA que Mao declarou, em 27 de fevereiro de 1957 (“Sobre a justa resolução das contradições no seio do povo”): “[…] a questão de quem vencerá, o socialismo ou o capitalismo, ainda não está decidida”. E como Hinton coloca: “Nenhuma política poderia, de nenhum dos dois lados, ser aplicada sem que fosse contestada”, ou seja, havia uma tensão extrema entre as duas tendências. Ele continua: “Culpar Mao, então, pela luta que se seguiu e por seu resultado, é injustificável, irrealista e anti-histórico. Mao fez o que precisou fazer dada a sua base social [os camponeses pobres e os operários na aliança que ele cultivou], assim como Liu fez o que precisou fazer com a base social que tinha. Depois de uma década de conflito, as coisas chegaram em um cume na Revolução Cultural […]. Mao, politicamente, tinha a vantagem. Ele conseguia falar diretamente com as massas e mobilizar centenas de milhões de camponeses e operários. Mas Liu tinha a vantagem organizativamente […] em 1958, […] graves problemas […] em conjunto com um péssimo clima em 1959, ‘60 e ‘61 levaram à escassez da colheita e fome. As iniciativas de Mao falharam temporariamente, mas estavam corretas. […] Durante a Revolução Cultural extremos parecidos se colocaram. […] No entanto, o movimento como um todo foi uma grande inovação criativa na história. Ela não era um complô, nem um expurgo, mas uma mobilização de massas em que as pessoas eram incentivadas a intervir, a vigiar e a supervisar os seus dirigentes e a formar comitês populares para exercer o controle de baixo para cima. […] A contradição principal do momento era a luta de classes entre a classe trabalhadora e a classe capitalista que se exprimia no interior do partido […]; a não ser que ela fosse resolvida a favor da classe trabalhadora, a revolução socialista iria naufragar. […] O método deveria ser a mobilização das pessoas comuns, para que elas tomassem o poder desde baixo para estabelecer órgãos de direção, democraticamente eleitos, e era […] resumido com a frase ‘bombardear o quartel-general’ […], o alvo da Revolução Cultural [eram] ‘os quadros do partido em posição de autoridade que tomavam a via capitalista’”.
Basicamente, para resolver a contradição entre a “via proletária” e a “via burguesa” no partido a favor da primeira, os maoistas na RC tentaram plantar as sementes para uma fase posterior do socialismo na fase atual, acabando assim com uma separação mecânica entre as duas fases e se concentrando em suas inter-relações[32]. As duas fases do socialismo, que supostamente se seguem cronologicamente, são a fase em que a distribuição do produto social se dá de acordo com o princípio “de cada um segundo suas habilidades a cada um segundo seu trabalho” seguido pela fase da distribuição segundo a norma “de cada uma segundo suas habilidades a cada um segundo suas necessidades”. Magdoff[33] explica que os maoistas se focam nas inter-relações entre os dois, e com isso enfatizam a necessidade de criar as pré-condições para a transição no interior da própria fase anterior, os pré-requisitos principais sendo a maneira como o produto social é distribuído e a mudança nas relações entre as pessoas. Se não for feito isso, as desigualdades produzidas e reproduzidas na fase atual irão levar ao surgimento e a consolidação de uma nova elite privilegiada que irá gradualmente se transformar em uma nova classe dominante. E eles tiram a sua justificativa para isso com uma referência à Crítica do programa de Gotha de Marx, com a sua descrição descrição enérgica necessária persistência da desigualdade em uma sociedade socialista (mas não comunista). Podemos entender, assim, porque as principais preocupações durante a RC eram “as medidas que tendiam a reduzir as diferenças que surgiam da divisão do trabalho entre cidade e campo, trabalho intelectual e manual, e administração e trabalhadores”, sabendo muito bem que a realização completa dessas medidas estava “em um futuro distante e envolvia muitas disputas políticas nos anos do futuro próximo”[34].
Está claro, então, que os maoistas rejeitam a interpretação mecânica do Prefácio de 1859 à Contribuição à crítica da economia política de Marx como uma teoria determinista da história feita por Stalin. Mao acusava Stalin de enfatizar apenas as forças produtivas (os meios de produção e a capacidade de trabalho humana) e negligenciar as relações de produção (relações de trabalho e relações de propriedade que garantem o controle das forças produtivas e dos produtos) e a superestrutura (instituições como o Estado, a família, a religião, a educação, o direito, a cultura e a ideologia). Mesmo no campo das forças produtivas, Stalin – diz Mao – negligenciou de uma maneira relativa o crescimento do potencial humano, que deveria constituir o centro das forças produtivas. Novamente, Stalin via a direção causal como essencialmente operando em um único sentido, da mudança nas forças produtivas para uma alteração das relações de produção e daí refazendo a superestrutura[35].
Ao invés disso, Mao defendia que os elementos da superestrutura só se transformam com um atraso considerável; a velha cultura permanece por muito tempo depois que a base da economia for radicalmente alterada. Mas, se um esforço consciente for feito para transformar os elementos da superestrutura, isso, por sua vez, afeta a base econômica (as forças produtivas e as relações de produção). Assim, Mao buscava impulsionar as comunas populares mesmo antes da modernização da agricultura, porque elas, na sua perspectiva, ao transformar as relações de produção e os elementos da superestrutura (estas últimas com algum atraso), iriam, por sua vez, impulsionar as forças produtivas. Por isso também a ênfase e a pressão nos efeitos econômicos sufocantes da estrutura de classe dominante nas fábricas durante a RC, ou na dominação dos senhores de terras e os capitalistas “compradores/burocráticos” no período anterior à liberação, ou nos efeitos libertadores da destruição da superestrutura (por exemplo, a cultura confucionista[36]. O quanto abertas são, aparentemente, as inter-relações entre as forças produtivas, as relações de produção e a superestrutura na concepção de Mao da teoria marxista da história?
Juntando os vários ramos
Vimos neste ensaio que, em sua melhor forma, o marxismo nos leva a esperar uma relação interna entre teoria e prática; onde uma delas for empobrecida, a outra estará em grande desvantagem. O maoismo, claramente, privilegiou a prática em relação à teoria – ele vê a prática como o ponto de fundação da teoria. Em seu ponto alto, e se lermos o fundamental Sobre a prática de Mao, escrito em julho de 1937, ele ataca tanto os dogmáticos quanto os empiristas, os oportunistas “de direita” e os “esquerdistas”. Como diz: “Prática [‘luta de classes, luta política e conquistas artísticas e científicas’], conhecimento, novamente prática e então conhecimento. Essa forma se repete em ciclos sem fim, e com cada ciclo o conteúdo da prática e do conhecimento se eleva a um nível superior”. E em seu excelente ensaio de agosto de 1937, Sobre a contradição, ele defende que as contradições – a luta entre opostos unidos funcionalmente – causa a mudança contínua. O desenvolvimento vem da resolução das contradições e a estratégia envolve a escolha da forma de luta mais adequada para resolver uma contradição. Mas a transformação qualitativa desejada só pode ser realizada através de uma série de fases, em que a fase atual é preparada com as sementes híbridas da fase posterior, dissolvendo assim as contradições mais fortes de um estágio no outro. O marxismo de Mao era da linhagem de Lênin, ainda que tendendo para perto de sua versão stalinista (que, como vimos, era uma versão decomposta do leninismo), mas lutando para superar e ir além do stalinismo.
Pintamos um quadro amplo com pinceladas grosseiras, indo do marxismo ao leninismo, e daí à sua revisão stalinista, e então para o maoismo nos termos de sua evolução e desenvolvimento na China do fim dos anos 1920 ao fim dos anos 1960, focando nas suas diferenças específicas. Vimos que essas foram:
- os camponeses pobres no interior de uma sociedade capitalista atrasada ou semifeudal, mais do que o proletariado urbano, constituíram a base de apoio de massas do movimento;
- a teoria da revolução por estágios, assim como a da revolução contínua, implicando uma relação próxima entre estágios sucessivos;
- o estágio da NRD, que tornou o capitalismo muito mais compatível com a democracia, assim auxiliando a transição para o socialismo;
- o caminho e a estratégia da GPP, que se sustenta nos camponeses, constrói zonas de base rurais, executa uma reforma agrária e outras políticas sociais nessas zonas (geridas democraticamente, como governos autossuficientes e independentes), construindo com isso uma base política de massas no campo, para, no fim, cercar e capturar as cidades;
- a concepção das “zonas de base” e da maneira de criá-las;
- “capturar” as cidades (ganhar o apoio das massas nelas) mostrando uma forma de nacionalismo que fosse verdadeiramente anti-imperialista, reorientando assim o movimento nacionalista de massas (durante a resistência anti-japonsa, em 1937-45) a favor da NRD;
- o centralismo democrático mais a linha de massas, garantindo que a “democracia” não seja subordinada ao “centralismo” e garantindo que as pessoas estivessem envolvidas na construção das políticas e em sua implementação;
- a ideia central de que as contradições – a luta entre opostos funcionalmente unidos – em cada fase levam o processo de desenvolvimento no sentido do socialismo, que deve ser implementado em uma série de estágios, em que o estágio atual, no momento correto, é preparado com as sementes do estágio seguinte, dissolvendo assim as contradições principais do atual e levando ao posterior;
- relações abertas entre as forças produtivas, as relações de produção e a superestrutura;
- a ideia de que os que detém o poder político, administrativo e burocrático se tornam uma nova elite dominante e que, dado um período de tempo, assumem a posição de uma nova classe exploradora, e que o povo deve ser constantemente mobilizado para lutar contra essa tendência;
A “dialética materialista”, como uma maneira de pensar e guiar a prática, foi uma ferramente poderosa nas mãos de Mao, mas suas fraquezas talvez estivessem relacionadas com as suas forças; ao fim, o próprio método levou Mao a superestimar o ritmo da mudança e a subestimar os obstáculos contra a mudança. Marx também caiu na mesma armadilha quando seu próprio método de análise o levou a acreditar que a revolução estava próxima, subestimando muito as grandes barreiras contra uma mudança progressiva. Será que a própria aplicação do método da dialética materialista leva os que a praticam a cair para o lado do “voluntarismo” em sua prática?
Se olharmos para os tempos posteriores a partir do ano de 1969 – o ano que marca o início do fim do período maoista – o grande retrocesso do socialismo para o capitalismo[37] nos espera logo adiante. Mas 1969 também nos oferece uma boa perspectiva dos anos anteriores. Pode ajudar começar contando um incidente da infância de Mao, quanto ele estava na escola, que o mesmo contou ao jornalista americano Edgar Snow em 1972. Um dia ele e seus colegas estudantes viram as cabeças decapitadas de rebeldes penduradas nos portões de uma cidade como aviso. Os rebeldes tinham liderado camponeses famintos em uma insurreição para conseguir comida. A repressão selvagem da rebelião foi imediata, e o incidente deixou uma impressão profunda no garoto, impressão que ele nunca esqueceu, se ressentindo profundamente com o tratamento dado aos rebeldes. Claramente, desde muito jovem, Mao passou a enxergar a ordem social dominante como simplesmente intolerável e a esperar uma onda revolucionária mais cedo ou mais tarde. “Uma única centelha pode incendiar a pradaria”, ele disse aos seus camaradas mais próximos em janeiro de 1930; vinte anos depois, se diz que ele declarou: “O povo chinês se levantou!”. Há também uma história emocionante sobre a entrada triunfal de Mao em Pequim que vale a pena contar[38]:
“Havia um milhão de chineses presentes para recebê-lo. Um grande palco, de quatro metros de altura, foi construído no fim de uma grande praça, e enquanto ele subia os degraus do fundo do palco, o topo da sua cabeça apareceu e gritos de boas-vindas saíram de um milhão de gargantas, aumentando e aumentando enquanto a figura solitária se levantava e aparecia toda. E quando Mao […] viu a grande multidão, ele parou por um momento, e então subitamente cobriu o seu rosto com as duas mãos e chorou.”
Mas nos anos depois de 1969, e mesmo no meio dos anos 1960, como vimos, a questão de se a China seria capitalista ou socialista não estava decidida. Aos 72 anos de idade, o guerrilheiro em Mao se levantou de novo – melhor queimar do que entrar em declínio. O como Jerome Ch’en[39], citando Mao, o poeta, colocou:
“A Revolução Chinesa estava em uma encruzilhada. Ela poderia ‘olhar para o fundo do precipício’ e recuar ou ‘chegar à altura do nono céu’ e então ‘retornar à felicidade com canções de triunfo’. A escolha, de acordo com o poeta, dependia inteiramente do ‘desejo de ir mais alto’.”
Quatro anos depois, o que permanecia eram as brasas – havia chegado o tempo de simplesmente se retirar. Não muito depois, seus camaradas mais próximos, Zhou Enlai e Zhu De, morreram. A ideia de Shakespeare de que “todo o mundo é um palco” se tornou um clichê, mas certamente foi um dos maiores prazeres da vida de Mao ter estado no mesmo palco que estes dois. Havia chegado o momento para que um dos maiores revolucionários marxistas de todos os tempos subisse às estrelas para se juntasse a Marx, Engels, Lênin, Trotsky, Stalin, os 20 milhões de soldados do Exército Vermelho que morreram na guerra contra o fascismo e os vários guerrilheiros camponeses do Exército Popular de Libertação que sacrificaram suas vidas na grande marcha por um mundo melhor.
O maoismo, no entanto, deve ser chamado à responsabilidade: por que os camponeses e operários não resistiram aos grandes retrocessos para o capitalismo na China e na União Soviética, às contrarrevoluções? A verdade só pode ser bastante desapontadora, pelo menos se julgarmos o maoismo, como é justo, pelos frutos de seu projeto de levar a humanidade adiante no caminho para a igualdade, a cooperação, a comunidade e a solidariedade. Na própria China, o maoismo não venceu neste ponto – todas as ações unificadas dos operários e camponeses pobres, toda a educação de massas do período maoista não parece ter levado o desenvolvimento intelectual das massas a um ponto em que, quanto foi necessário confrontar os “que tomavam a via capitalista” depois de 1978 para defender as ideias de igualdade e cooperação contra a hierarquia e a competição, elas teriam feito o necessário. O maoismo falhou em oferecer um modelo vitorioso e funcional de socialismo no século XX. E, o que é pior, enquanto Mao estava em seus últimos anos de vida, a China Popular entrou em uma acomodação com o imperialismo norte-americano contra a União Soviética – Sobre a contradição de Mao foi manipulado para justificar o acordo. Em uma violação de uma importante orientação maoista, o nacionalismo subordinou o anti-imperialismo quando, em 1974, Deng Xiaoping usou a chamada “teoria dos três mundos” para racionalizar a virada “à direita” da política internacional chinesa. Mas apesar desses limites, não pode haver dúvida de que em um longo período, do fim dos anos 1920 ao fim dos anos 1960, o maoismo fez uma coisa sem precedentes na história da humanidade – ele realizou uma drástica redistribuição de renda e riqueza na China, transformou radicalmente a maneira como o excedente econômico da sociedade chinesa era produzido e utilizado, e isso para melhor.
O legado de Mao e o futuro do maoismo
Chegou o momento, então, de falar do legado de Mao. Como vimos, o maoismo tem uma visão definida de como chegar ao socialismo, e do que precisa ser feito para satisfazer as necessidades básicas de todos em um país pobre. O desenvolvimento deve ser conquistado em bases igualitárias – estamos todos nele juntos e todos ascendem juntos. O que fazer então do legado de Mao, o maoismo? Certamente, isso está em aberto para todos os que compartilham sua visão de mundo, seu método de análise – a dialética materialista –, seus valores, sua visão e decidem embarcar juntos na grande marcha para o socialismo, sabendo desde o início que a jornada está repleta de perigos consideráveis. O que dizer, então, do maoismo na Índia[40], poderíamos perguntar? A China maoista fez o seu melhor para alimentar, vestir e abrigar a todos, mantê-los saudáveis e educar a maior parte deles. Basta comprar isso com as condições deploráveis da Índia no fim dos anos 1960 e mesmo hoje – a tragédia de uma Índia governada por sua própria grande burguesia – e podemos compreender porque alguns na Índia veem o modelo maoista de desenvolvimento como o caminho para uma vida mais rica e plena para todos. Anu – com quem começamos este artigo – era um deles.
No entanto, enquanto podemos ter um grande respeito por essas pessoas, devemos colocar uma questão: o caminho básico e a estratégia revolucionária que foram necessários na China dos anos 1930 e 1940 são corretos para a Índia do século XXI? Bem, a Índia é muito diferente da China daqueles tempos, e mais ainda em sua história, geografia, estrutura social e de classes, tradições, e na natureza de seu capitalismo atrasado/“semifeudal”, na acomodação da grande burguesia com o imperialismo, na força do aparato repressivo do Estado, na questão das nacionalidades e daí em diante. E, isso é importante, enquanto a história chinesa está repleta de rebeliões camponesas difusas e periódicas, a história indiana, em um sentido comparativo, tem poucas dessas rebeliões, o que talvez possa ser explicado nos termos das castas[41], fundamentalmente opostas a qualquer unidade significativa dos explorados e oprimidos. Lembremos que Mao adaptou seu marxismo-leninismo à realidade da história da China, às potencialidades da China; “aprendam a verdade a partir da prática” era a sua mensagem. Certamente, um partido [PCI (maoista)] que veio de uma tendência política que, nos últimos 40 anos, fez o seu melhor para levar adiante a revolução na Índia deve reavaliar profundamente o abismo que é a Índia – sua história, suas potencialidades.
Os maoistas deve manter em mente que a validade científica do maoismo que defendem será julgada em primeiro lugar, na Índia, por suas contribuições para explicar corretamente a realidade social indiana. Há muitas coisas em que eles foram importantes nesse sentido, por exemplo, ao enfatizar a dependência parasitária do capital indiano do Estado para garantir a sua expansão, o que é exprimido na noção da capital burocrático. Ou enfatizando o forte papel do Estado na própria formação da grande burguesia indiana (é claro, o fortalecimento das classes dominantes pelo “Estado”, muito mais do que o inverso, chega até os tempos antigos, como percebeu o grande historiador D. D. Kosambi). Os maoistas também nos ajudaram a ver as “reformas agrárias” oficiais do pós-1956 como tendo levado a uma fusão parcial das antigas classes de proprietários rurais em um novo e mais amplo estrato de proprietários rurais ricos, todos aqueles que não colocam suas mãos no arado, incluindo uma parte dos antigos arrendatários, que, apesar de sua participação nos mercados, ainda têm que se livrar de várias práticas “semifeudais” e de elementos culturais pré-capitalistas. Além disso, são os maoistas que, em sua prática, corretamente não tentam diferenciar os pobres rurais em “proletariado agrário” e “camponeses sem terra”, sabendo muito bem que a mesma unidade doméstica pobre pode ser categorizada em uma ou outra posição em diferentes momentos no tempo. E, organizando o “proletariado agrário”/”campesinato sem terra” junto com os camponeses pobres e médios e uma fração dos camponeses ricos, eles insistem em colocar a questão de castas, apesar de saberem como isso pode ser altamente problemático e dolorosamente difícil. São também os maoistas que, mais do que outros, primeiro compreenderam o caráter brutal das classes dominantes e dos líderes de partidos políticos que cooptaram, as mesma categorias cujos antecessores assumiram o poder em nome da não-violência de Ghandi. Todo esse conhecimento é essencialmente derivado da prática; e, não precisamos dizer, se alinhando com o legado de Mao, o conteúdo da prática e o conhecimento têm que ir continuamente sendo elevados.
O partido [PCI (maoista)] tem sido muito condenado por suas atividades violentas, incluindo mortes. A violência, no entanto, tem que ser vista no contexto da guerra civil não declarada que acontece nas áreas sob sua influência, por exemplo, em Dantewada, no estado de Chattisgarh[42]. O governo está implementando uma política bárbara de contrainsurgência, que inclui alimentar uma rede de informantes e combatentes entre a população civil, desde o nível das aldeias até os níveis mais amplos – uma suposta resistência popular apoiada e financiada pelo Estado [chamada Salwa Judum (SJ)] contra os maoistas. Aldeias inteiras foram evacuadas e os aldeões jogados forçadamente em campos de refugiados, e isso em circunstâncias de aquisição de terras em larga escala por corporações privadas em uma região rica em minerais. Os últimos quatro anos viram ataques violentos, saques, destruição, intimidação, estupro e assassinatos em uma escala sem precedentes, principalmente da parte dos SJ; na verdade, este último tem até mesmo recrutado de maneira forçada os desabrigados para suas fileiras. Sem dúvidas, as mortes são causadas por ambos os lados, mas a grande diferença é que os maoistas, em geral, quando tomam como alvo representantes específicos do Estado ou mesmo informantes, eles primeiro os avisam para desistir da atividade anti-povo que estão desenvolvendo. Os culpados de estupro, tortura, assassinatos de reféns ou responsáveis por mortes em “encontros” são atacados diretamente pra que os outros, com medo dessas represálias, desistam de fazer o mesmo. No que diz respeito aos representantes do SJ, qualquer pessoa que se juntar a eles pode se tornar alvo, não por alguma inimizade pessoal, mas por causa do papel que o SJ tem assumido nessa guerra civil não declarada.
Mais geralmente, a violência também tem que ser cista no contexto da relação real de fato entre o poder político e o econômico nos níveis locais e regionais; as classes dominantes, por vários meios, exercem controle sobre a polícia e o judiciário, o que aumenta as chances de confronto violento entre as classes em conflito[43].
Aqueles que deliberada e falsamente apresentam os maoistas como “devotos da violência” escolhem ignorar o fato de que a violência dos oprimidos (e neste momento os maoistas os lideram) sempre foi precedida e provocada pela violência dos opressores (e pelo Estado e as forças militares privadas que os apoiam). Afirmar, como alguns liberais fazem, que a violência dos oprimidos é “moralmente equivalente” à dos opressores é defender um Estado reacionário que, de fato, apoia os opressores. E nessa época de controle da opinião pública, a “programação” do que o público pensa, vê e lê, os “fatos” que são disseminados são artificialmente separados de toda uma imensa série de fatos relevantes, nunca permitindo que o público perceba o presente “real”.
Mas, ainda que reconhecendo que as contradições antagônicas entre organizações de classes inimigas irá chegar à violência, é um princípio maoista que as ações de guerrilha devem ser subordinadas a uma política de “linha de massas” – as guerrilhas maoistas têm que assumir como principal ganhar as massas do povo em suas zonas de base e, como consequência, nas áreas próximas – trabalhar para um equilíbrio (“proporcionalidade”) melhor do que nunca entre meios e fins. No que diz respeito ao recurso à violência na revolução, para estender o que compreendi de suas obras, seria justo dizer que Marx e Engels não teriam discordado do uso de métodos violentos pelas forças revolucionárias na Índia de hoje. Nunca se poderia esperar que as classes dominantes entregassem sem poder sem lançar mão de todo o poder repressivo que têm. É importante, talvez, lembrar que a resposta de Marx às “acusações de crimes e crueldade” contra os “rebeldes hindus” em 1857 foi formulada para responder à violência diária “à sangue frio” da dominação britânica na Índia[44].
Quanto à afirmação falsa de que os maoistas não têm apoio de massas em suas áreas de influência, temos apenas que ouvir os observadores independentes, perceptivos e sensíveis, que conhecem a situação local. As forças do Estado são muito maiores (no que diz respeito aos armamentos e números) do que as guerrilhas maoistas, e ainda assim os camponeses tribais apoiam as últimas. Por que estes camponeses assumem o risco de apoiar os mais fracos, mesmo quando sabem que as guerrilhas não estão mais no local e que eles, como seus apoiadores, estarão vulneráveis às forças do Estado e irão, muito provavelmente, ser mortos? Se, contra o risco da própria morte, os camponeses escolhem as guerrilhas, certamente deve haver alguma coisa mais importante se passando ali.
Além da Índia, o maoismo é uma força política considerável no Nepal[45], nas Filipinas[46] e no Peru[47]. Os líderes maoistas nepaleses foram imaginativos – as suas ideias sobre uma combinação dos modelos chinês (vitória no campo e difusão pelas cidades) e russo (vitória nas cidades e difusão para o campo) de revolução e sobre uma “democracia do século XXI” (competição multipartidária enquanto todos estiverem de acordo com os objetivos da “nova democracia”) são instigantes. Mas essas teorias estão sendo colocadas a provas severas na prática. O Partido Comunista Unificado do Nepal (maoista), dada a sua relativa força diante dos “inimigos” da democracia e de seus aliados e senhores no exterior das fronteiras de seu pequeno país (especialmente na Índia), busca utilizar a república burguesa como um estágio para concentrar as forças das massas empobrecidas e das camadas nacionalistas médias para se mover no sentido de uma NRD[48].
O que dizer então do futuro do maoismo e da renovação do socialismo que ele promete? Francamente, “as chances de que as revoluções do século XX nos dariam modelos funcionais de socialismo” passaram há muito tempo; “nos dizem que o socialismo foi tentado e fracassou”[49]. Mas, como Marx foi o primeiro a mostrar, os obstáculos para um futuro melhor não podem ser resolvidos pelo capitalismo. O desafio, então, é reviver e renovar o legado do socialismo. O maoismo pode iluminar o caminho nesse sentido?
O maoismo tem suas raízes em Marx, que era, acima de tudo, defensor de uma democracia radical – ele exigia a reconstrução da comunidade e da solidariedade de massas; ele sonhava com a comunhão dos seres humanos e da natureza; ele reforçava a dialética da libertação; ele olhava para o futuro, para uma sociedade justa que possibilitasse uma “individualidade rica”; e, como Paresh Chattopadhyhay[50] lembra, ele insistia na abolição da circulação mercantil, da divisão do trabalho e do Estado… Mas Lênin também, em seu O Estado e a Revolução, era um democrata até o fim, ainda que tenha introduzido em sua concepção do socialismo elementos que se opõem à “livre associação dos indivíduos” – o trabalho assalariado e o Estado[51].
Mao e os maoistas chineses também se mostraram democratas revolucionários, ainda mais se levarmos em contra as 20 milhões de pessoas marchando pelas ruas em várias cidades chinesas na última semana de maio de 1968, os manifestantes gritando especialmente a palavra de ordem “viva a herança revolucionária da grande Comuna de Paris!”. De fato, a interpretação de Marx da Comuna de Paris foi assumida como importante para a retomada da revolução na China, fato que encontrou um lugar nos famosos “Dezesseis Pontos” de 8 de agosto de 1966[52]. “Quem cem flores cresçam, que cem escolas disputem” não era apenas uma política para o incentivo do progresso nas artes e nas ciências, mas uma impulsão para o florescimento de uma cultura socialista, pelo menos era essa a afirmativa.
Assim, dada a corrente democrática radical que corre de Marx a Mao, a melhor coisa que o maoismo poderia fazer é se dedicar à promessa de uma democracia radical; afinal de contas, se por um lado é verdade que não pode haver liberdade em nenhum sentido significativo sem igualdade, uma vez que os ricos seriam certamente mais “livres” (teriam mais opções de vida) do que os pobres, por outro não pode haver igualdade sem liberdade, uma vez que alguns teriam mais poder político do que outros.
Até aqui, as revoluções inspiradas por Marx tiveram apenas a participação de uma minoria significativa. Será que o comprometimento com uma democracia radical no desenvolvimento da luta poderia contribuir para mobilizar a maioria? Os meios serão, então, cuidadosamente escolhidos para que nunca possam subordinar a orientação socialista?
* Editor adjunto da Economic & Political Weekly, membro do Comitê para a Proteção dos Direitos Democráticos de Mumbai, autor de “India after Naxalbari: Unfinished History”.
Notas:
[1] Paul Sweezy, “What is Marxism?” Monthly Review, Vol. 36, Nº 10, Março de 1985, pp. 1-6.
[2] Paul Sweezy, “What is Marxism?” Monthly Review, Vol. 36, Nº 10, Março de 1985, pp. 3-4.
[3] Paul Sweezy, “Marxism and Revolution 100 Years after Marx”, Monthly Review, Vol. 34, nº 10, Março de 1983, pp. 2-3.
[4] Ver Geoffrey Kay, Development and Underdevelopment: A Marxist Analysis, (Londres: Macmillan).
[5] Paul Sweezy, “Notes on the Centennial of Das Kapital”, Monthly Review, Vol. 19, No 7, dezembro de 1967, pp 1-16.
[6] Harry Braverman, “Lenin and Stalin” in Monthly Review, junho de 1969, pp 45-55.
[7] Ralph Miliband, “Dictatorship of the Proletariat” in Tom Bottomore (ed) Dictionnary of Marxist Thought, 2000, pp 151-52.
[8] Ralph Miliband, “Dictatorship of the Proletariat” in Tom Bottomore (ed) Dictionnary of Marxist Thought, 2000, p. 152.
[9] Ralph Miliband, “Stalinism” in Tom Bottomore (ed) Dictionnary of Marxist Thought, 2000, pp. 517-520.
[10]Ralph Miliband, “State and Revolution” in Tom Bottomore (ed) Dictionnary of Marxist Thought, 2000, pp. 524.
[11]Ralph Miliband, “State and Revolution” in Tom Bottomore (ed) Dictionnary of Marxist Thought, 2000, pp. 525.
[12] Ralph Miliband, “The State and Revolution”, in Paul M Sweezy & Harry Magdoff (ed): Lenin Today: Eight Essays on the Hundredth Anniversary of Lenin’s, 1970.
[13] George Thomson, “From Lenin to Mao Tse-tung”, in Paul M Sweezy & Harry Magdoff (ed): Lenin Today: Eight Essays on the Hundredth Anniversary of Lenin’s Birth , 1970, pp. 115-25.
[14] Mobo Gao, The Battle for China’s Past: Mao and the Cultural Revolution . Londres: Pluto Press. 2018.
[15] Mobo Gao, The Battle for China’s Past: Mao and the Cultural Revolution , capítulo 6.
[16] Mobo Gao, The Battle for China’s Past: Mao and the Cultural Revolution .
[17] Paul Sweezy, “Socialism in Poor Countries”, Monthly Review, Vol. 28, No. 5, outubro de 1976, pp 1-13.
[18] John G. Gurley. China’s Economy and the Maoist Strategy , p. 70-71. New York: Monthly Review Press. 1976.
[19] John G. Gurley. China’s Economy and the Maoist Strategy , p. 72-73. New York: Monthly Review Press. 1976.
[20] Benjamin Schwartz, “The Philosopher”, in Dick Wilson (ed): Mao Tse-tung in the Scales of History: A Preliminary Assessment Organized by the China Quarterly (Cambridge: Cambridge University Press), pp 9-34.
[21] Paul Sweezy, “Capitalism and Democracy”, Monthly Review, Vol. 32, No. 2, junho de 1980, pp 27-32.
[22] Paul Sweezy, “Capitalism and Democracy”, Monthly Review, Vol. 32, No. 2, junho de 1980.
[23] William Hinton.“Mao, Rural Development, and Two-Line Struggle”, Monthly Review, Vol 45, No 9, fevereiro de 1994, pp 1-15; China: An Unfinished Battle—Essays on Cultural Revolution and Further Developments in China . Kharagpur: Cornerstone Publications. 2002; “On the Role of Mao Zedong”, Monthly Review, Vol. 56, No. 4, setembro de 2004, pp. 51-59.
[24] Dave Pugh, “William Hinton and the Cultural Revolution”, Monthly Review, Vol 56, No 10, março de 2005, 33-42.
[25] Benjamin Schwartz, Chinese Communism and the Rise of Mao . Cambridge: Cambridge University Press. 1955.
[26] William Hinton, Shenfan: The Continuing Revolution in a Chinese Village , p. 6-7. New York: Vintage Books. 1983.
[27] William Hinton, “Mao, Rural Development, and Two-Line Struggle”, Monthly Review, Vol 45, No 9, fevereiro de 1994, pp. 6.
[28] Utsa Patnaik, “The Republic of Hunger”, Social Scientist, Vol 32, No 9/10, setembro/outubro de 2004, pp 9-35.
[29] Joseph Ball, “Did Mao Really Kill Millions in the Great Leap Forward?” Monthly Review, setembro de 2006, em https://monthlyreview.org/0906ball.htm.
[30] William Hinton, “On the Role of Mao Zedong”, Monthly Review, Vol 56, No 4, setembro de 2004, 51-59.
[31] William Hinton, “On the Role of Mao Zedong”, Monthly Review, Vol 56, No 4, setembro de 2004, p. 54.
[32] Harry Magdoff, “China: Contrasts with the USSR”, Monthly Review, número especial “China’s Economic Strategy: Its Development and Some Resulting Contrasts with Capitalism and the USSR”, Vol 27, No 3, julho-agosto de 1975, pp. 12-57.
[33] Harry Magdoff, “China: Contrasts with the USSR”, Monthly Review, número especial “China’s Economic Strategy: Its Development and Some Resulting Contrasts with Capitalism and the USSR”, Vol 27, No 3, julho-agosto de 1975, pp. 53-54.
[34] Ibidem.
[35] Mao Tse-tung. A Critique of Soviet Economics. New York: Monthly Review Press. 1977.
[36] Christopher Howe & Kenneth R Walker. “The Economist”, in Dick Wilson (ed): Mao Tse-tung in the Scales of History: A Preliminary Assessment Organized by the China Quarterly, pp 176-177. Cambridge: Cambridge University Press. 1977. John G. Gurley China’s Economy and the Maoist Strategy, capítulo 2. New York: Monthly Review Press. 1976.
[37] Hari P. Sharma. Critical Perspectives on China’s Economic Transformation: A “Critical Asian Studies” Roundtable on the book China and Socialism by Martin Hart-Landsberg and Paul Burkett. Delhi: Critical Asian Studies and Daanish Books. 2007.
[38] Esse episódio foi contado por Zhou Enlai a Charlie Chaplin em Genebra, durante a crise coreana, quando o primeiro veio negociar um fim à Guerra da Coréia e Chaplin viabilizou uma exibição de Luzes da Cidade ao visitante. Charles Chaplin: My Autobiography , p. 526, 530. New York: Pocket Books. 1966.
[39] Jerome Ch’en &d Mao Tse-tung, “An Unpublished Poem by Mao Tse-tung”, The China Quarterly, No. 34, abril-junho de 1968, pp 2-5.
[40] Sumanta Banerjee, In the Wake of Naxalbari: A History of the Naxalite Movement in India . Calcutta: Subarnarekha. 1980. Tilak D. Gupta, “Maoism in India: Ideology, Programme and Armed Struggle”, Economic & Political Weekly, número especial “Maoist Movement in India”, Vol 41, No 29, julho de 2006, 22, pp. 3172-76. Mohan Ram Maoism in India . Delhi: Vikas Publications. 1971
[41] Barrington Moore Jr.: Social Origins of Dictatorship and Democracy: Lord and Peasant in the Making of the Modern World , capítulos 4, 6 e 9. Londres: Penguin. 1967
[42] PUDR, When the State Makes War On Its Own People: A Report on Violation of People’s Rights During the Salva Judum Campaign in Dantewada, Chhattisgarh. Delhi: People’s Union for Democratic Rights. 2006.
[43] Além disso, religião, etnicidade e nacionalidade foram cartas decisivas usadas pelos principais partidos políticos e seus representantes com o objeivo de dividir as massas trabalhadoras em nível local no subcontinente indiano. A criminalidade endêmica de mobilizações comunalistas-religiosas e os pogroms executados contra a principal minoria religiosa da Índia têm sido os resultados mais trágicos desse tipo de política semifascista num passado recente.
[44] Karl Marx, “Investigation of Tortures in India”, New York Daily Tribune, 17 de setembro de 1857, em http://www.marxists.org/archive/marx/works/1857/09/17.htm.
[45] Baburam Bhattarai, “The Royal Regression and the Question of the Democratic Republic”, Monthly Review, março de 2005, em https://monthlyreview.org/0305commentary.htm. Baburam Bhattarai & WPRM-Britain,“Nepal: Interview with Baburam Bhattarai”, 26 de outubro de 2009, World People’s Resistance Movement, em http://www.wprmbritain.org:80/?p=926. John Mage & Bernard D’Mello, “The Beginnings of a New Democratic Nepal?” MRZine, 16 de março de 2007, em http://mrzine.monthlyreview.org/md160307.html. Hisila Yami Parvati, “People’s Power in Nepal”, Monthly Review, Vol 57, No 6, novembro de 2005, pp 19-33.
[46] Jose Maria Sison, The Philippine Revolution: Leader’s View . New York: Crane Russak, Taylor & Francis Group. 1989. Jose Maria Sison, “‘The Guerrilla is Like a Poet…’—Professor Jose Maria Sison in Conversation with Bernard D’Mello”, Frontier, 30 de março – 5 de abril de 2003, pp 3-5.
[47] Hobart A. Spalding, “Peru on the Brink”, Monthly Review, Vol. 43, No. 8, janeiro de 1992, pp 29-43. Hobart A. Spalding, “Peru Today: Still on the Brink”, Monthly Review, Vol. 44, No. 10, 1993, pp 31-39. Gary P. Leupp, “Peru on the Threshold: A Reply to Hobart A Spalding”, Monthly Review, Vol. 44, No. 10, 1993, pp 25-30.
[48]Baburam Bhattarai & WPRM-Britain,“Nepal: Interview with Baburam Bhattarai”, 26 de outubro de 2009, World People’s Resistance Movement, em http://www.wprmbritain.org:80/?p=926.
[49] Paul M. Sweezy, “Socialism: Legacy and Renewal” Monthly Review, Vol 44, No 8, janeiro de 1993, pp 1-9.
[50] Paresh Chattopadhyay, “Worlds Apart: Socialism in Marx and in Early Bolshevism”, Economic & Political Weekly, Vol. 20, No. 53, dezembro de 2005, pp 5629-34.
[51] Paresh Chattopadhyay, “Worlds Apart: Socialism in Marx and in Early Bolshevism”, Economic & Political Weekly, Vol. 20, No. 53, dezembro de 2005, pp 5629-34.
[52] Meisner, Maurice, “Images of the Paris Commune in Contemporary Marxist Thought”, The Massachusetts Review, Vol. 12, No. 3, verão de 1971, pp 479-97. Joan Robinson. The Cultural Revolution in China. Harmondsworth: Penguin. 1970.