Mineiros e estudantes expõem os limites do pós-apartheid na África do Sul

Por Gabriel Landi Fazzio

De vez em quando, os efeitos das greves dos mineiros sul-africanos sobre o comércio internacional furam o silêncio ideológico da mídia comercial. Nessas horas, vemos que não devemos confundir o silêncio dominante com a suposta insignificância das lutas da classe trabalhadora. Ao contrário, o motivo aqui é um medo que tira o sono das classes dominantes.

Em outubro de 2015, os desdobramentos de anos de lutas operárias e estudantis trouxeram dias de agitação social há décadas não presenciadas na África do Sul. Evidentemente, a mídia burguesa não pode oferecer uma leitura global dos acontecimentos, sob o risco de expor suas proporções críticas – que tencionam de alto abaixo a sociedade sul-africana. Tal exposição, ainda que não aprofundasse uma análise histórica das contradições em movimento na sociedade sul-africana, necessariamente precisaria abordar alguns pontos: o aumento das tensões entre o movimento operário e o governo do Congresso Nacional Africano; e a crescente efervescência das classes médias.

A Aliança Tripartite minada

Com o fim do apartheid, nos anos 90, formou-se a Aliança Tripartite, que levou ao poder o Congresso Nacional Africano (ANC), partido a que pertenceram todos os presidentes do país desde então. Existente desde 1912, o partido sempre foi próximo ao Partido Comunista da África do Sul (SACP), segundo componente da aliança hegemônica. Por fim, o terceiro suporte da aliança é aquele a ser analisado mais detidamente: o COSATU, ou, Congresso Sul Africano de Sindicatos.

Fundada em 30 de novembro de 1985 pela união de 33 sindicatos, a COSATU se propunha a ser uma federação de sindicatos em oposição ao regime do apartheid e “comprometidos com uma África do Sul não-racial, não-sexista e democrática”. Frente à retórica socialista do ANC e comunista do SACP, no entanto, espanta que desde cedo o COSATU limitasse suas reivindicações classistas ao direito de greve e um salário mínimo nacional.

Dos 1,8 milhões de membros do COSATU, 18% pertencem ao Sindicato Nacional dos Metalúrgicos da África do Sul, o NUMSA, que na verdade abrange a mineração, energia, construção e diversas indústrias relacionadas. Se, por um lado, o COSATU nunca sustentou uma imagem radical, o NUMSA desde sua fundação em 1987 se autodeclara marxista-leninista. Tal contraste permeou toda a duração da Aliança Tripartite, e está na raiz das crescentes mobilizações operárias. Já em 1998, surgia uma organização em ruptura com a participação do NUMSA no COSATU, a AMCU (Associação de Sindicatos de Mineiros e Construtores).

Para uma breve contextualização econômica, cabe lembrar que, mesmo com a queda do peso da mineração no PIB (de 21% em 1970 para 6% em 2011), a atividade ainda representa 60% das exportações do país, somando um valor estimado em mais de $56 mil milhões de dólares em 2011. 78% da platina comercializada no planeta provém da África do Sul, sendo a riqueza mais exportada pelo país. Em segundo lugar vem o ouro, mais de 10% da produção mundial. Em terceiro lugar, o carvão. Cerca de 77% da energia consumida na África do Sul é produzida do carvão, e cerca de 92% do carvão consumido em todo continente africano vem do país.

O piso salarial oficial dos mineradores de carvão é cerca de R 7000 rands (equivalendo a R$1995 reais em outubro de 2015 – 1 real ≅ 0,285 rands). No ramo do ouro, os salários orbitam R 6000. Para ter uma noção do custo de vista, podemos verificar que o preço do aluguel mensal de um quarto em Johannesburgo é em torno de R 4 mil. O custo mensal médio em transporte se estima em R 400. Um quilo de queijo, frango e carne custam, respectivamente, R 79, R 59 e R 84. Um carro do modelo Volkswagen Golf 1.4 (a Alemanha é a segunda maior fonte de importações do país) se vende, em média, por R 270.000.

Em 2008, com a derrota de Thabo Mbeki, alinhado a Nelson Mandela, por Jacob Zuma, no interior do ANC, o governo guinou aceleradamente para a implementação da cartilha neoliberal no país.

Em 2012, a partir do massacre de Marikana, as contradições do regime se desenvolveram aceleradamente. Durante a greve, os trabalhadores renegaram sua representação pelo NUMSA, se aproximando da AMCU. Argumentando a ilegalidade da greve, diante da representação incerta, a burguesia exigiu a repressão do movimento. Foi considerado o caso de maior uso de força letal pelas forças de segurança sul-africanas desde 1960, com dezenas de mortos e centenas de feridos. A radicalização do NUMSA em resultado desta tragédia é evidenciada pelas lutas ideológicas no interior do COSATU. Em dezembro do ano seguinte, um congresso do NUMSA deliberou passar à oposição aberta ao ANC, com a intenção de constituir um Movimento pelo Socialismo e um Partido dos Trabalhadores.

Em 2014, mais uma vez as greves surpreenderam por sua força: dirigida pela AMCU, a paralização por 21 semanas de cerca de 70 mil trabalhadores das minas de platina foi a mais longa greve da história do país. No mesmo ano, o NUMSA rompe definitivamente com a Aliança Tripartite, sendo expulso do COSATU dias depois. Em decorrência, mais 1/3 dos sindicatos suspenderam sua participação na federação.

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Até então, as greves se concentravam majoritariamente nas minas de platina. No começo de outubro de 2015, as mobilizações se espalharam pelas minas de ouro e carvão. No segundo caso, foram as primeiras greves relacionadas a negociações salariais desde 2011. Glencore, Anglo American, Exxaro e outros produtores menores tiveram suas atividades paralisadas pelo NUMSA, ameaçando as reservas de carvão das termoelétricas da Eskom, a empresa pública de eletricidade.

Em 14 de outubro, milhares de trabalhadores compareceram às ruas de Johannesburgo sob o chamado da NUMSA de um dia de greve geral e ação, sob a palavra de ordem de “o capitalismo produz corrupção, defender os empregos!”. Diversas atividades paralisaram, incluindo os condutores de ônibus. Muitas pessoas se mobilizaram de outras cidades para comparecer aos protestos. A crítica disseminada aponta para como o programa da Aliança para o Empoderamento Econômico Negro produziu uma elite extremamente dependente das negociatas e corrupções estatais – e pouco reduziu o peso da burguesia branca na economia sul-africana.

Horas depois, as empresas retomaram as negociações, e a greve foi encerrada com a conquista dos índices de aumento salariam demandados pelos trabalhadores. A fim de evitar novas greves, as mineradoras celebraram um acordo com duração de dois anos.

No entanto, não são apenas as reivindicações salariais que levam os mineiros a protestar: nas últimas décadas, a população empregada no setor reduziu de 800 para 500 mil. A África do Sul caiu da primeira para a quinta posição de maior exportador de ouro do mundo. Apenas de 2012 para 2014, o setor fechou mais de 35 mil postos de trabalho – sendo cerca de 22.900 nas minas de ouro, 10.800 nas de platina e 1.600 nas minas de ferro. Com a desaceleração da econômica chinesa, tal cenário tende a se agravar, uma vez que 13% das exportações da África do Sul são voltadas para o país. Com um quarto da população economicamente ativa desempregada, a pátria de Mandela se torna palco de crescentes ataques xenofóbicos a imigrantes de outros países africanos, acusados de “roubar empregos”.

Tais impasses permitem ao regime uma margem de manobra limitada, e as lutas operárias tendem não só a se ampliar – mas irradiar para outras camadas da sociedade. A hegemonia da Aliança Tripartite é gradualmente minada.

Rhodes deve cair

As turbulências no interior da frente sindical do regime gradualmente produziram efeitos no interior das classes médias e demais camadas da classe trabalhadora. Já em 2011, o surgimento da Frente da Esquerda Democrática foi apontado por militantes operários anarquistas como uma ruptura da pequena-burguesia radical com o governo.

Em dezembro de 2012, o Partido Socialista e dos Trabalhadores (WASP) foi fundado por comitês de trabalhadores em greve nas minas de platina, após o massacre, de Marikana. Um ano após, contaria com a adesão do Movimento Nacional do Transporte, um racha do COSATU.

Em dezembro de 2014, a fundação do Lutadores da Liberdade Econômica (EFF), favorável à expropriação estatal dos meios de produção, pode ser compreendida no mesmo sentido. O partido declara “extrair inspiração da ampla tradição marxista-leninista e da escola fanoniana de pensamento em sua análise do estado, imperialismo, cultura e contradições de classe”. Ademais, o partido se inspira no socialista moçambicano Samora Machel, no burkinabê Thomas Sankara, entre outros.

É nesse contexto que devem ser apreendidos os movimentos estudantis iniciados em março: nos marcos da crise do regime pós-apartheid. No dia 9 de março, o estudante da Universidade da Cidade do Cabo (UCT) Chumani Maxwele deflagrou o movimento que viria a se chamar Rhodes Deve Cair (Rhodes Must Fall). Com mais uma dúzia de colegas, Chumani atirou fezes humanas sobre a estátua de Cecil Rhodes, um notório colonizador britânico, demandando sua retirada do campus da universidade em meio a danças de protesto (toyi-toyi). A campanha se alastrou rapidamente, se autodeclarando um “movimento coletivo de estudantes e funcionários mobilizados para ação direta contra a realidade do racismo institucional na universidade” e demandando a “descolonização” da educação. Em 9 de abril a estátua finalmente foi removida, após deliberação do conselho universitário.

O sucesso da campanha agiu como uma faísca na pradaria seca do racismo institucional diagnosticado por estudantes de outras universidades. Na Universidade de Stellenbosch, manifestações questionaram o papel da linguagem, em especial o africânder, no processo educacional. Na Universidade de Rhodes, a agitação em favor da mudança de nome da instituição conseguiu, em maio, a aprovação de planos para início do processo de renomeação.

Em 22 de março de 2015, o EFF emitiu um chamado pela retirada de outros símbolos do colonialismo e do apartheid. Sob o clima de radicalização presente, atos de vandalismo contra estátuas se deflagraram em todo o país, não deixando de fora nem mesmo a estátua do Rei George V, na Universidade de KwaZulu-Natal. Monumentos à Guerra Anglo-Boer foram atacados, incluindo o memorial pelos soldados britânicos caídos em combate, a estátua de Paul Kruger, em Pretoria, e a estátua de Louis Botha, do lado de fora do parlamento, na Cidade do Cabo.

Diante das acusações dos meios de comunicação, responsabilizando o partido por tais atos, o EFF prontamente recuou, como o pequeno-burguês assustado com as consequências de suas palavras radicais. Alegou que assumiria a responsabilidade apenas pelos atos de seus membros, e que o EFF era a favor da remoção, e não danificação ou destruição dos símbolos coloniais e do apartheid. Isso não evitou, contudo, que os atos espontâneos de vandalismo seguissem expressando o radical descontentamento das massas – em 18 de setembro, um busto de bronze de Rhodes teve seu nariz arrancado e foi grafitado com as palavras “Racista, ladrão, assassino”. Os protestos massivos, no entanto, diminuíram por meses.

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Isso até o movimento de 19 de outubro. O papel desempenhado pela greve geral de 14 de outubro em Johannesburgo é evidente: foi nesta mesma cidade que os estudantes da Universidade Wits entraram em greve em resposta ao anúncio do governo de que as taxas de inscrição subiriam 6%, bem como as de acomodação subiriam 9% e as de matrícula seriam aumentadas em 10.5%. Oito entradas para o campus foram fechadas por barricadas e pneus em chamas. Os estudantes da Universidade da Cidade do Cabo e da Universidade de Rhodes não demoraram a aderir à mobilização. Em 21 de outubro, as maiores universidades do país se somavam à paralização, deflagrando a maior mobilização estudantil desde o levante de Soweto, em 1980. A greve se alastrou para mais 13 grandes instituições de ensino superior. Apenas duas universidades do país não se integraram à onda de protestos. A primeira geração nascida após o apartheid se movia – denunciando a permanência da opressão das massas negras.

No discurso estudantil, reaparece a crítica ao programa da Aliança para o Empoderamento Econômico Negro. Conforme a descrição de uma estudante, o resultado de tal política legou ao país “uma vasta, enorme maioria negra ao fundo com uma camada de creme e gotas de chocolate no topo”.

O presidente do Partido Comunista, Blade Nzimade, ministro da educação desde 2008, foi alvo principal do protesto, sendo sua permanência no cargo ainda incerta. Ao menos a consciência de Nzimade parece tranquila: a seu ver, o governo é vítima de seu próprio sucesso na ampliação do acesso à Universidade. Um belo exemplo de como escancarar dados e ocultar perguntas: afinal, de que modo esse sucesso teria produzido tais reveses?

 Nem o próprio presidente Zuma foi poupado: estudantes tentaram invadir o parlamento, na Cidade do Cabo, durante um pronunciamento do presidente. Com os ânimos escalando, a despeito da liderança estudantil afirmar o caráter pacífico dos protestos, ocorreram diversos choques entre a polícia e os manifestantes. Atos em solidariedade foram organizados nos EUA e na Inglaterra. Na última sexta-feira, 23 de outubro, os protestos em Pretoria atraíram mais de 10 mil pessoas. No entanto, na tarde deste dia, quando finalmente Zuma anunciou o congelamento das taxas, mal havia manifestantes à frente do parlamento para ouvi-lo: a massa havia sido dispersada sob sprays de pimenta e granadas de efeito moral, ao tentar furar o bloqueio que impedia o acesso ao parlamento. O mal-estar provocado pelo desencontro entre a repressão e a vitória foi tamanho que, por todo o fim de semana, a imprensa especulou se de fato os protestos se encerrariam.

 Na segunda-feira 26, a maior parte das universidades amanheceu ainda paralisadas. Max Price, vice-chanceler da Universidade da Cidade do Cabo, declarou que a instituição seguiria fechada por toda a semana, além de retirar as acusações contra estudantes e funcionários. A Universidade de Cabo do Oeste chegou a abrir suas portas, mas novos protestos forçaram seu fechamento. Na Universidade Wits, onde se iniciou a onda de protestos, um abaixo-assinado contava desde a manhã com 4 mil assinaturas pelo retorno das aulas, diante dos nove compromissos propostos pela reitoria. No entanto, durante a reunião que deliberaria pelo fim da greve, uma briga irrompeu entre dois funcionários, adiando a decisão pelo retorno das aulas para o dia seguinte. Contrariando a decisão do conjunto do movimento, no entanto, uma parcela dos estudantes seguem mobilizados, interrompendo as aulas e provocando distúrbios na universidade.

 Ainda sem muita nitidez dos rumos a tomar, a juventude universitária sul-africana segue mobilizada, consciente de que suas vitórias são ainda muito pequenas frente ao racismo institucional das unidades de ensino e da necessidade de ampliar ao acesso à educação superior pública, mediante a luta contra as próprias taxas congeladas. Do mesmo modo, a difícil construção entre uma luta unitária dos trabalhadores das minas e dos estudantes parece distante no horizonte – e, ainda assim, são as duas forças sociais que mais apressadamente escancaram a crise da hegemonia pós-apartheid, e que denunciam a mesma falência do projeto de construir um capitalismo sem racismo.

A despeito de suas hesitações e contradições, e sem ser um discurso que abarque as palavras de ordem estudantis, o EFF parece ao menos disposto a retornar as bandeiras da classe trabalhadora à posição de protagonismo dos protestos. Diante da onda de inquietação social, a organizações convocou para o dia 27 de outubro uma manifestação pacífica, à qual compareceram cerca de 50 mil pessoas. 4.1A iniciativa parece buscar ampliar a presença do partido em regiões de menor influência – pesquisas de 2013 indicam que 49% dos apoiadores do partido são jovens de menos de 24 anos, majoritariamente negros (99%) e homens (67%), desproporcionalmente distribuídos pelo país. A título de exemplo, na província natal de Julius Malema, a controversa liderança do partido, há um apoio de 28% da população, enquanto em KwaZulu-Natal, província mais populosa do país, o apoio não passa de 1%.4.2

Em seu trajeto, a marcha passou por três importantes pontos da cidade Johannesburgo, deixando suas reivindicações:

Para o Banco Central, o EFF demandou “maior intervenção, propriedade e controle estatal”, redução das taxas de juros e abandono das metas de inflação, além de mais créditos para os pequenos produtores rurais. Diante da Câmara de Minas, organização dos empresários da mineração, as palavras de ordem reivindicavam a nacionalização das minas. “O estado deve possuir e controlar ao menos 60% das minas da África do Sul sem indenização”, além de um salário mínimo de R12.500 para os mineiros. Por fim, diante da Bolsa de Valores, o EFF afirmou que a Bolsa de Valores “de modo algum reflete a população da África do Sul.” “Por conseguinte, a Bolsa carrega a obrigação incontestável de desfazer a injustiça do passado que continua a perpetuar mesmo hoje”. Aqui, o caráter confuso da política pequeno-burguesa radical se escancara: à Bolsa de Valores (!) se reivindica que todas as companhias sejam direcionada à socialização da propriedade, “o que significa que deveriam dar reais e significativas ações para seus empregados”, que receberiam dividendos ao fim de cada ano. “No mínimo 51% das companhias da Bolsa deveriam ser possuídas e controladas por trabalhadores. Isso é diferente do esquema de Empoderamente Econômico Negro que empodera apenas alguns indivíduos”. Infelizmente, o EFF falha em explicar porque apenas 51%. Fala, ao mesmo tempo, em ações e dividendos e controle operário. E, mais espantoso ainda, parece crer que em qualquer circunstância uma Bolsa de Valores poderia ceder a tais concessões!

Em todo caso, o EFF exige respostas em 30 dias e ameaça: “Isso é um alerta para as autoridades, é um aguçar das contradições e uma intensificação da consciência revolucionária na sociedade”.

Esse caráter contraditório fica mais evidente quando vemos a concepção de governo que advoga o EFF. Suas teses parecem distinguir pouco de qualquer governo moderno-burguês, mesmo que pontualmente afirme a intenção de “agitar pela transferência de poder para o povo e fazer a democracia real para a maioria”. Com 6,35% dos votos nas eleições de 2014, o terceiro maior partido do país (que alega ter meio milhão de membros) parece acreditar que basta sua eleição para iniciar uma transformação radical. Talvez isso surpreenda menos se levarmos em conta as recorrentes acusações, pela NUMSA, quanto à “estrutura militar de comando” do partido – a despeito de o partido não indicar qualquer apoio à violência revolucionária.

Mas tais críticas às contradições do EFF não excluem a possibilidade de que, no curso dos acontecimentos, haja uma solução à esquerda para cada uma de suas insuficiências programáticas com base em seu próprio programa econômico. No mínimo, será uma organização que contribuirá para a radicalização das massas sob bandeiras socialistas, ainda que não possa levar às últimas consequências tais reivindicações, e precise ser superado em algum momento.

Só o cinismo e o descaso para com as lutas dos explorados e oprimidos do mundo pode afastar o otimismo que brota das crescentes lutas das massas sul-africanas. Esse otimismo, no entanto, não pode nos cegar para as colossais tarefas colocadas à frente da classe trabalhadora e da juventude do África do Sul. A crise do regime não se solucionará por si só, podendo se estender até um desfecho catastrófico. A menos que ocorra uma súbita aproximação entre os operários e os estudantes, sob a liderança de uma organização radical e consequente, o movimento tenderá a interromper continuamente seu curso, e voltar “ao que parecia resolvido para recomeçá-lo outra vez”, escarnecendo “com impiedosa consciência as deficiências, fraquezas e misérias de seus primeiros esforços” – como a própria juventude de hoje parece fazer com os protestos de Soweto, questionando o quão realmente vitoriosa foi a luta contra o apartheid. Pode mesmo parecer que o movimento derruba “seu adversário apenas para que este possa retirar da terra novas forças e erguer-se novamente, agigantado”. É de se esperar que, enquanto não tenha consciência da “magnitude infinita de seus próprios objetivos”, o movimento hesite, recue e retorne, até que se crie uma situação crítica, que torne “impossível qualquer retrocesso, e na qual as próprias condições gritem: eis Rhodes, salta aqui”!

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