Feudalismo cordial? O mito do Tibete.

Por Michael Parenti, via Michael Parenti political archive, traduzido por Red Yorkie

Se a China é a grande história de sucesso de um desenvolvimento rápido do livre mercado, e se ela deve ser o modelo e a inspiração para o futuro do Tibete, então, é possível que o antigo Tibete feudal comece a parecer ser bem melhor do que realmente era.

  1. Para Lordes e Lamas

A experiência de conforto e paz interiores prometida por todas as religiões – e, nesse quesito, nenhuma delas se compara ao budismo – vem sempre acompanhada por conflitos banhados em sangue. Em claro contraste com a selvageria intolerante de outras religiões, o budismo, segundo seus adeptos, seria livre de dogmas e fanatismo. Para muitos deles, mais do que uma teologia, o budismo seria uma disciplina meditativa e investigativa, com o objetivo de promover harmonia e iluminação interiores, ao mesmo tempo em que orienta seus seguidores em direção ao caminho da vida correta. De modo geral, o foco espiritual não é apenas dirigido à própria pessoa, mas visa o bem-estar dos outros. O adepto busca colocar de lado interesses egoístas e tenta adquirir um entendimento mais profundo de sua conexão com todas as pessoas e coisas. O “budismo socialmente engajado” procura misturar a libertação individual com iniciativas sociais responsáveis, a fim de criar uma sociedade iluminada.

Um olhar na história, porém, mostra que nem todas as inúmeras e altamente diversas variantes do budismo estiveram a salvo do fanatismo doutrinário nem de experiências envolvendo violência e exploração, tão típicas de outras religiões. No Sri Lanka, há um registro histórico lendário e quase sagrado sobre as batalhas triunfais travadas por monarcas budistas do passado. Durante o século XX, houve disputas violentas entre budistas contra outros budistas e não-budistas em inúmeros países, como Tailândia, Birmânia, Coreia, Japão e Índia, entre outros. No Sri Lanka, combates armados entre cingaleses budistas e tâmiles hinduístas ceifaram muitas vidas de ambos os lados. Em 1998, o Departamento de Estado dos EUA fez uma lista dos trinta grupos extremistas mais violentos e perigosos do mundo. Mais da metade deles tinha origem religiosa, especificamente muçulmanos, judeus e budistas.1

Na Coreia do Sul, em 1998, milhares de monges da ordem budista Chogye entraram em conflito, usando pedras, coquetéis molotov, cassetetes e os próprios punhos, em embates violentos que duraram semanas. Eles disputavam o controle da ordem, a maior da Coreia do Sul, com um orçamento anual de US$ 9,2 milhões, além dos milhões de dólares em bens e o privilégio de nomear 1.700 monges para vários cargos. Os conflitos danificaram os principais santuários budistas e deixaram dezenas de monges feridos, alguns com gravidade. O público coreano parecia repudiar ambas as facções, pressentindo que, qualquer que fosse o lado que saísse vitorioso, “as doações dos fieis seriam usadas para comprar carros caros e residências de luxo”.2

Como em qualquer religião, disputas entre ou dentro de seitas budistas são frequentemente alimentadas pela corrupção material e pelas deficiências pessoais da liderança. Por exemplo, em Nagano, no Japão, no prestigioso complexo de tempos Zenkoji, que tem sido a sede de seitas budistas por mais de 1.400 anos, houve “uma batalha vergonhosa” entre Komatsu, o sacerdote-chefe, e Tacchu, um grupo de templos nominalmente sob o controle do sacerdote-chefe. Os monges de Tacchu acusaram Komatsu de vender documentos e desenhos em nome do templo em benefício pessoal. Eles também estavam horrorizados com a frequência com que ele era visto em companhia de mulheres. Komatsu, por sua vez, procurou isolar e punir os monges que criticavam sua liderança. O conflito durou cerca de cinco anos e foi parar nos tribunais.3

Mas e quanto ao budismo tibetano? Seria ele imune a estes tipos de disputas? E o que dizer da sociedade que o ajudou a criar? Muitos budistas afirmam que, antes da repressão chinesa em 1959, o antigo Tibete era um reino dedicado à vida espiritual, livre do egoísmo, do materialismo vazio e de vícios corruptores que infestam as sociedades industrializadas modernas. A imprensa ocidental, os livros de viagem, romances e filmes de Hollywood retratam a teocracia tibetana como um verdadeiro Xangri-lá. O próprio Dalai Lama disse que “a influência predominante do budismo” no Tibete, “em meio a amplos espaços abertos e um meio ambiente imaculado, resultaram em uma sociedade dedicada à paz e a harmonia. Éramos felizes e livres.”4

No entanto, uma leitura da história do Tibete sugere uma imagem um tanto quanto diferente. “Conflitos religiosos eram comuns no Tibete antigamente”, escreve um praticante ocidental do budismo. “A história contradiz a imagem de uma Xangri-lá onde lamas tibetanos e seus seguidores viviam juntos em tolerância mútua, paz e harmonia. De fato, a realidade era bem diferente. O antigo Tibete era muito mais parecido com a Europa durante as guerras religiosas da Contrarreforma.”5 No século XIII, o Imperador Kublai Khan criou o primeiro Grande Lama, que viria a presidir todos os outros lamas, como um papa em relação a seus bispos. Vários séculos mais tarde, o Imperador da China enviou um exército ao Tibete em apoio ao Grande Lama, um jovem ambicioso de 25 anos, que então se intitulou Dalai (Oceano) Lama, o soberano de todo o Tibete.

Suas duas “encarnações” anteriores foram reconhecidas retroativamente como seus antecessores. Assim, o 1º Dalai Lama passou a ser o 3º. Esse 1º (ou 3º) Dalai Lama confiscou monastérios que não pertenciam a sua seita, e acredita-se que tenha destruído textos budistas que contradiziam sua pretensão à divindade. Seu sucessor imediato seguiu uma vida hedonista, tendo muitas amantes, festejando com amigos e agindo de outras maneiras consideradas inadequadas para uma divindade encarnada. Devido a essas transgressões, ele acabou sendo morto por monges da própria seita. Em 170 anos, apesar do reconhecimento de seu status divino, cinco Dalai Lamas foram mortos por seus sumos sacerdotes ou outros cortesões.6

Por centenas de anos, seitas budistas tibetanas concorrentes envolveram-se em disputas extremamente violentas e execuções sumárias. Em 1660, o 5º Dalai Lama viu-se às voltas com uma rebelião na província de Tsang, reduto da seita rival Kagyu e seu alto lama, conhecido como o Karmapa. O 5º Dalai Lama reprimiu duramente os rebeldes, ordenando que o exército mongol obliterasse as linhas masculinas e femininas, além de seus descendentes, “como ovos esmagados contra as rochas… Em suma, aniquilem qualquer traço deles, inclusive seus nomes.”7

Em 1792, muitos monastérios Kagyu foram confiscados, e seus monges foram obrigados a se converter à seita Gelug (a denominação do Dalai Lama). A escola Gelug, também conhecida como os “Chapéus Amarelos”, mostrou pouca tolerância ou disposição para misturar seus ensinamentos com os de outras seitas budistas. Nas palavras de uma de suas orações tradicionais: “Louvado seja o senhor, deus violento dos ensinamentos dos Chapéus Amarelos/que reduz a partículas de pó/grandes seres, altas autoridades e pessoas comuns/que poluem e corrompem a doutrina Gelug.”8 Um livro de memórias do século XVIII de um general tibetano retrata a disputa sectária entre monges budistas, tão brutal e sangrenta quanto qualquer outro conflito religioso.9 Essa história terrível permanece em grande medida ignorada por seguidores ocidentais do budismo tibetano atualmente.

As religiões sempre tiveram um relacionamento próximo não somente com a violência, mas com a exploração econômica. De fato, muitas vezes, a exploração econômica requer o uso da violência. Era assim com a teocracia tibetana. Até 1959, quando o Dalai Lama deixou de governar o Tibete, a maior parte das terras aráveis do país ainda era organizada em propriedades senhoriais trabalhadas por servos. Essas propriedades pertenciam a dois grupos sociais: os ricos proprietários de terras seculares e a aristocracia lamaica. Mesmo um escritor simpático à velha ordem admite que “grande parte das propriedades pertencia aos monastérios, e a maioria destes acumulava enorme riqueza”. Muita dessa riqueza foi acumulada “por meio da participação direta no comércio, nos negócios e no empréstimo de dinheiro”.10

O monastério de Drepung foi um dos maiores proprietários de terras do mundo, com suas 185 propriedades rurais, 25.000 servos, 300 campos de pastagem e 16.000 pastores. A riqueza dos monastérios estava concentrada nas mãos de um pequeno número de membros da alta hierarquia lamaica. A maioria dos monges comuns vivia modestamente e não tinha acesso direto a essa enorme riqueza. O próprio Dalai Lama “vivia ricamente no Palácio de Potala de 14 andares e 1.000 cômodos”.11

Líderes seculares também se saíam bem. Um exemplo notável foi o do comandante-em-chefe do exército tibetano, membro do gabinete laico do Dalai Lama, que era dono de 4.000 km2 de terras e 3.500 servos.12 A imagem do antigo Tibete foi distorcida por alguns admiradores ocidentais como sendo a de “um país que não precisava de força policial porque seu povo observava voluntariamente as leis do carma”.13 Na verdade, ele contava com um exército profissional, ainda que pequeno, que servia principalmente como força policial a serviço dos proprietários de terras, a fim de manter a ordem, proteger suas propriedades e perseguir servos fugitivos.

Era comum que famílias de camponeses tivessem os filhos pequenos levados à força para monastérios, para serem treinados como monges. Uma vez lá, criava-se uma obrigação por toda a vida. Tashì-Tsering, um monge, relata que era comum que filhos de camponeses sofressem abusos sexuais nos monastérios. Ele mesmo foi vítima de repetidos abusos, começando aos nove anos de idade.14 Os monastérios também recrutavam crianças para serem trabalhadores domésticos, dançarinos e soldados, em servidão vitalícia.

No antigo Tibete, havia um pequeno número de agricultores que subsistiam como camponeses livres, e talvez cerca de 10.000 pessoas que compunham as famílias de “classe média”, formadas por comerciantes, lojistas e pequenos mercadores. Milhares de outros eram mendigos. Havia também escravos, normalmente, trabalhadores domésticos que não tinham nada em seu nome. Seus filhos já nasciam escravos. 15 A maioria da população rural era formada por servos. Tratados um pouco melhor do que escravos, os servos não tinham acesso nem à educação nem a serviços médicos. Estavam condenados a trabalhar de graça por toda a vida nas terras do senhor – ou nas terras do monastério –, além de cuidar da manutenção da casa do senhor, transportar sua colheita e coletar lenha para ele. Além disso, também deviam fornecer animais de carga e transporte assim que solicitados.16 Seus senhores diziam quais culturas deveriam ser cultivadas e quais animais deveriam ser criados. Eles não só eram proibidos de casar sem o consentimento de seu senhor ou lama, como podiam ser facilmente separados de suas famílias, caso fossem “alugados” por seus donos para trabalhar em localidades distantes.17

Como no sistema de trabalho livre e diferentemente da escravidão, os senhores não tinham nenhuma responsabilidade pela manutenção do servo e nenhum interesse direto em sua sobrevivência, como no caso de um bem caro. Os servos eram responsáveis pela própria manutenção. Ainda assim, como no sistema escravagista, estavam vinculados aos senhores, garantindo para estes uma mão de obra fixa e permanente que não podia se organizar nem fazer greves nem partir livremente, como é permitido a trabalhadores em um contexto de mercado. Os suseranos tinham o melhor de dois mundos.

Uma serva fugitiva de 22 anos relata: “Era comum que meninas bonitas fossem levadas pelo dono da casa para servirem como trabalhadoras domésticas e serem usadas a seu bel-prazer.” Elas “não passavam de escravas sem direitos”.18 Os servos precisavam de permissão para ir a qualquer lugar, e os proprietários de terras tinham autoridade legal para capturar aqueles que tentassem fugir. Um fugitivo de 24 anos saudou a intervenção chinesa como uma “libertação”. Seu testemunho deu conta de que, sob a servidão, ele estava sujeito a trabalho, fome e frio incessantes. Depois da terceira tentativa frustrada de fuga, foi tão castigado pelos capangas do senhor, que o sangue jorrava de seu nariz e boca. Segundo o rapaz, eles então jogaram álcool e soda cáustica em suas feridas, para aumentar a dor.19

Os servos eram tributados quando se casavam, no nascimento de cada filho e a cada morte na família. Eram tributados por plantar uma árvore no próprio quintal e por criar animais. Também eram taxados por ocasião de festivais religiosos e se tocassem tambores ou dançassem em público, ou quando eram enviados à prisão ou soltos. Aqueles que não conseguiam encontrar trabalho eram tributados por estarem desempregados e, se viajassem para outra vila, em busca de trabalho, tinham de pagar um tributo pela viagem. Quando uma pessoa não conseguia pagar, os monastérios faziam empréstimos para eles a uma taxa de juros de 20% a 50%. Algumas dívidas eram passadas de pai para filho, de filho para neto. Pessoas endividadas que não conseguissem fazer frente a suas obrigações corriam o risco de serem escravizadas.20

Os ensinamentos religiosos da teocracia reforçavam seu sistema de classes. Os pobres e aflitos eram ensinados de que eram culpados por seus próprios problemas porque haviam sido perversos em vidas pregressas. Por isso, tinham de aceitar a miséria de sua existência presente como forma de expiação cármica, na expectativa de que sua sorte melhorasse na próxima encarnação. Os ricos e poderosos tratavam sua boa fortuna como uma recompensa pela – e uma prova concreta de – sua virtude em vidas pregressas e no presente.

Cegos em relação à própria opressão, os servos tibetanos eram mais do que vítimas da superstição. Como vimos, alguns fugiam; outro resistiam abertamente, algumas vezes, sofrendo consequências terríveis. No Tibete feudal, a tortura e a mutilação – inclusive furar os olhos, arrancar a língua, cortar os tendões e amputar membros – eram as punições preferidas para ladrões e servos fugitivos ou que não aceitavam calados sua condição. Viajando pelo Tibete na década de 1960, Stuart e Roma Gelder entrevistaram um ex-servo, Tsereh Wang Tuei, que havia roubado duas ovelhas pertencentes a um monastério. Por esse motivo, ele teve os olhos vazados e uma mão mutilada a ponto de ficar inutilizada. Ele explica que não é mais budista: “Quando um lama sagrado disse para eles me cegarem, pensei que não havia bondade na religião.”21 Como tirar uma vida humana é contra os ensinamentos budistas, alguns delinquentes eram açoitados sem dó e, então, “entregues a deus” na noite gelada, para que morressem. “Os paralelos entre o Tibete e a Europa medieval são impressionantes”, conclui Tom Grunfeld em seu livro sobre o Tibete. 22

Em 1959, Anna Louise Strong visitou uma exposição sobre equipamentos de tortura que haviam sido usados pelos suseranos tibetanos. Havia algemas de todos os tamanhos, inclusive pequenas, para crianças, além de instrumentos para cortar narizes e orelhas, vazar olhos, quebrar as mãos e cortar os tendões das pernas. Havia também ferros de marcar, chicotes e ferramentas para estripar. A exposição apresentava fotografias e testemunhos de vítimas que haviam sido cegadas ou aleijadas ou que sofreram amputações por terem sido condenadas por roubo. Um dos casos era o de um pastor, cujo senhor devia a ele um reembolso em dinheiro e trigo, mas que se recusava a pagar. Então, ele pegou uma das vacas do senhor; por isso, teve as mãos cortadas. Outro pastor, que se opunha a ter a mulher tomada pelo senhor, teve as mãos quebradas. Há fotos de ativistas comunistas, cujos narizes e lábios superiores foram extirpados, e de uma mulher que foi violentada e, depois, teve o nariz decepado.23

Antigos visitantes comentaram sobre o despotismo teocrático do Tibete. Em 1895, um inglês, Dr. A. L. Waddell, escreveu que a população estava sob uma “tirania intolerável de monges” e sob a influência de superstições diabólicas que estes inventaram para aterrorizar as pessoas. Em 1904, Perceval Landon descreveu o governo do Dalai Lama como “uma máquina de opressão”. Por essa época, outro viajante inglês, o capitão W.F.T. O’Connor, observou que “os grandes proprietários de terras e os monges… exercem, cada qual em seu domínio, um poder despótico do qual não há recurso”, enquanto as pessoas são “oprimidas pelo mais monstruoso avanço do monasticismo e do sacerdócio”. Os governantes tibetanos “inventaram lendas degradantes e estimulavam um espírito de superstição” entre as pessoas comuns. Em 1937, outro visitante, Spencer Chapman, escreveu, “O monge lamaísta não passa o tempo ministrando para as pessoas ou as educando. […] O mendigo ao lado da estrada não é nada para o monge. O conhecimento é uma prerrogativa dos monastérios guardada a sete chaves e usada para aumentar sua influência e riqueza.”24 Por mais que queiramos que as coisas sejam diferentes, o Tibete teocrático feudal estava a léguas de distância da versão romantizada de Xangri-lá, cultivada de maneira tão entusiástica pelos prosélitos ocidentais do budismo.

  1. Secularização x Espiritualidade

O que aconteceu ao Tibete depois que os comunistas chineses entraram no país em 1951? O tratado daquele ano previa autonomia ostensiva sob o comando do Dalai Lama, mas cedia à China o controle militar e o direito exclusivo de conduzir as relações exteriores. Os chineses também passaram a ter um papel direto na administração interna, “a fim de promover reformas sociais”. Entre as primeiras mudanças por eles promovidas estava a redução das taxas de juros usurárias, além da construção de alguns hospitais e estradas. Inicialmente, eles avançaram lentamente, fazendo uso, principalmente, da persuasão, numa tentativa de promover a reconstrução. Nenhuma propriedade aristocrática ou monástica foi confiscada, e os senhores feudais continuaram a dominar seus camponeses vinculados hereditariamente. “Ao contrário da crença popular no Ocidente”, explica um observador, os chineses “tomaram cuidado para mostrar respeito pela cultura e religião tibetanas”.25

Durante séculos, os lamas e lordes tibetanos haviam visto os chineses irem e virem, e haviam desfrutado de boas relações com o Generalíssimo Chiang Kai-shek e seu regime reacionário, o Kuomintang, na China.26 A aprovação pelo governo do Kuomintang era necessária para validar a escolha do Dalai Lama e do Panchen Lama. Quando o atual Dalai Lama, o 14º, foi instalado em Lhasa, isso foi feito sob uma escolta de tropas chinesas e a presença de um ministro chinês, em conformidade com uma tradição secular. O que irritou os lamas e lordes tibetanos no início da década de 1950 foi que as autoridades chinesas presentes eram comunistas. Seria apenas uma questão de tempo, eles temiam, antes que os comunistas começassem a impor seu projeto coletivista igualitário sobre o Tibete.

A situação complicou-se em 1956-57, quando bandos armados tibetanos emboscaram comboios do Exército Popular de Libertação da China. O levante recebeu amplo apoio da Agência Central de Inteligência (CIA) dos EUA, inclusive treinamento militar, acampamentos de apoio no Nepal e incontáveis voos de transporte.27 Enquanto isso, nos Estados Unidos, a Sociedade Americana para uma Ásia Livre, uma entidade de fachada financiada pela CIA, dava publicidade incessantemente à causa da resistência tibetana, tendo o irmão mais velho do Dalai Lama, Thubtan Norbu, desempenhando um papel ativo na organização. O segundo irmão mais velho do Dalai Lama, Gyalo Thondup, instituiu uma operação de inteligência com a CIA já em 1951. Mais tarde, essa operação foi transformada em uma unidade de guerrilha, treinada pela CIA, cujos recrutas retornavam ao Tibete pulando de paraquedas.28

Vários dos agentes e soldados tibetanos enviados ao país pela CIA eram chefes de clãs aristocráticos ou filhos de chefes. Noventa por cento deles, segundo um relatório da própria agência, desapareceram, sendo mais provável que tenham sido capturados e mortos.29 “Muitos lamas e membros da elite laica e parte considerável do exército tibetano uniram-se à insurreição, mas o grosso da população não se juntou a eles, garantindo seu fracasso,” escreve Hugh Deane.30 Em seu livro sobre o Tibete, Ginsburg e Mathos chegam a uma conclusão parecida: “Até onde pudemos averiguar, a maior parte das pessoas comuns de Lhasa e dos arredores não se uniu à luta contra os chineses, nem no início nem à medida que a revolta ia progredindo.”31 Com o passar do tempo, a resistência desmoronou.

Quaisquer que sejam os erros e novas opressões introduzidas pelos chineses após 1959, eles aboliram a escravidão e o sistema de servidão tibetano de trabalho não pago. Eliminaram muitos impostos abusivos, iniciaram projetos de infraestrutura e reduziram enormemente o desemprego e a pobreza extrema. Instituíram escolas seculares, quebrando, assim, o monopólio educacional dos monastérios. Além disso, construíram sistemas elétricos e de abastecimento de água em Lhasa.32

Heinrich Harrer (cujo passado como sargento nas SS de Hitler foi descoberto posteriormente) escreveu um best-seller sobre suas experiências no Tibete, que acabou virando um conhecido filme de Hollywood. Ele relatou que os tibetanos que se opunham aos chineses “eram predominantemente nobres, membros da pequena nobreza e lamas; eles eram punidos sendo obrigados a realizar as tarefas mais humildes, como trabalhar em estradas e pontes. Também eram humilhados, ao serem obrigados a limpar a cidade antes da chegada de turistas.” Além disso, tinham de viver em um acampamento originalmente destinado a mendigos e pedintes – o que Harrer considera uma prova concreta da natureza pavorosa da ocupação chinesa.33

Em 1961, as autoridades de ocupação chinesas expropriaram as terras que pertenciam aos lordes e aos lamas. Elas distribuíram milhares e milhares de hectares para rendeiros e camponeses sem terra, reorganizando-os em centenas de comunas. Rebanhos, que antes pertenciam à nobreza, eram entregues para cooperativas de pastores pobres. Melhorias foram implementadas na reprodução do gado, e novas variedades de vegetais e novas cepas de trigo e cevada foram introduzidas, junto com aprimoramentos na irrigação, e tudo isso, aparentemente, levou a um aumento na produtividade agrária.34

Muitos camponeses permaneceram tão religiosos quanto antes, fazendo doações para o clero. Mas os monges que haviam sido forçados desde criança a ingressarem nas ordens religiosas agora estavam livres para renunciar à vida monástica, e milhares deles fizeram isso, especialmente os mais jovens. O restante do clero vivia de modestos estipêndios governamentais e da renda extra ganha ao oficiarem cerimônias, casamentos e funerais.35

Tanto o Dalai Lama quanto seu assessor e irmão mais novo, Tendzin Choegyal, alegavam que “mais de 1,2 milhão de tibetanos foram mortos como resultado da ocupação chinesa.”36 O censo oficial de 1953 – seis anos antes da repressão chinesa – registrou que toda a população residente no Tibete era de 1.274.000.37 Outras estatísticas indicavam que a população do Tibete seria de aproximadamente dois milhões de habitantes. Se os chineses tivessem matado 1,2 milhão de pessoas no início da década de 1960, então, quase todo o Tibete teria ficado despovoado, tendo sido transformado em um enorme campo de matança salpicado com campos de extermínio e valas comuns – a respeito dos quais não há indício algum. A força de ocupação chinesa, escassamente distribuída pelo Tibete, não poderia ter perseguido, capturado e exterminado essa quantidade de pessoas, mesmo se tivesse dedicado todo o tempo exclusivamente a isso e mais nada.

As autoridades chinesas alegam que acabaram com as chicotadas, mutilações e amputações como forma de punir crimes. Elas mesmas, porém, foram acusadas de atos de brutalidade por tibetanos exilados. As autoridades admitem que ocorreram “erros”, especialmente durante a Revolução Cultural (1966-76), quando a perseguição de crenças religiosas atingiu um ponto alto na China e no Tibete. Depois da insurreição, no final da década de 1950, milhares de tibetanos foram encarcerados. Durante o Grande Salto Adiante, a coletivização forçada e o cultivo de cereais foram impostos ao campesinato tibetano, algumas vezes com efeitos desastrosos sobre a produção. No final da década de 1970, a China começou a relaxar os controles “e tentou consertar alguns dos erros cometidos durante as duas décadas anteriores”.38

Em 1980, o governo chinês iniciou reformas ostensivamente criadas para conceder um maior grau de autonomia e autogoverno ao Tibete. Agora, os tibetanos teriam permissão para cultivar lotes privados, vender o excedente de suas colheitas, decidir por conta própria quais culturas plantar, e criar iaques e ovelhas. A comunicação com o mundo exterior foi novamente liberada, e os controles fronteiriços, relaxados, para permitir que alguns tibetanos visitassem parentes exilados na Índia e no Nepal.39 Durante a década de 1980, muitos dos principais lamas haviam começado a se deslocar, indo e voltando, entre a China e as comunidades exiladas no exterior, “restaurando seus monastérios no Tibete e ajudando a revitalizar o budismo por lá”.40

Em 2007, o budismo tibetano ainda era amplamente praticado e tolerado pelas autoridades chinesas. Peregrinações religiosas e outras formas comuns de veneração foram permitidas, mas dentro de limites. Todos os monges e monjas tinham de assinar uma declaração de lealdade, afirmando que não usariam sua posição religiosa para fomentar secessão ou dissidência. E exibir fotos do Dalai Lama era considerado ilegal.41

Na década de 1990, os han, o grupo étnico que compreende mais de 95 por cento da imensa população chinesa, começaram a se mudar em números substanciais para o Tibete. Nas ruas de Lhasa e Shigatse, sinais da colonização han são facilmente visíveis. Chineses administram as fábricas e muitas das lojas e bancas de vendas. Edifícios de escritórios altos e grandes centros comerciais foram construídos com recursos que poderiam ser mais bem gastos em habitação e usinas de tratamento de água. Muitas vezes, chineses no Tibete veem seus vizinhos tibetanos como sendo pessoas atrasadas e preguiçosas, precisando de desenvolvimento econômico e “educação patriótica”. Durante a década de 1990, funcionários governamentais tibetanos suspeitos de nutrir simpatias nacionalistas eram removidos de suas funções, e campanhas eram mais uma vez lançadas, para desacreditar o Dalai Lama. Tibetanos supostamente estavam sujeitos a captura, encarceramento e trabalhos forçados, por participar de atividades separatistas e de “subversão política”. Alguns eram mantidos em prisão administrativa, sem acesso adequado a alimentos, água e cobertores, sujeitos a ameaças, espancamentos e outros tipos de maus tratos.42

História, cultura e, certamente, religião tibetanas são temas omitidos nas escolas. Os materiais de ensino, embora traduzidos para o tibetano, estão centrados principalmente na cultura e na história chinesas. As leis de planejamento familiar chinesas permitem que as famílias tibetanas tenham até três filhos (Na China, há um limite de apenas um filho para famílias han, e de dois filhos para famílias han no meio rural quando a primeira criança é uma menina.). Se um casal tibetano ultrapassar o limite de três filhos, as crianças excedentes podem perder o direito a creche, saúde, habitação e educação subsidiadas. Essas penalidades foram implementadas de maneira irregular e variam por distrito.43 Nenhum desses serviços para crianças, é importante notar, estava disponível para os tibetanos antes da anexação chinesa.

Para os ricos lamas e a aristocracia secular, a intervenção comunista foi uma catástrofe completa. A maioria deles fugiu para o exterior, como fez o próprio Dalai Lama, que foi auxiliado em sua fuga pela CIA. Alguns descobriram, para seu horror, que teriam de trabalhar para se sustentar. Muitos, porém, conseguiram escapar desse destino. Durante a década de 1960, a comunidade tibetana no exílio recebia, de maneira clandestina, US$ 1,7 milhão ao ano da CIA, segundo documentos liberados pelo Departamento de Estado em 1998. Assim que esse fato foi tornado público, a organização do Dalai Lama emitiu um pronunciamento admitindo que havia recebido milhões de dólares da CIA durante a década de 1960, para enviar esquadrões armados de exilados para o Tibete, a fim de desestabilizar a revolução maoísta. O Dalai Lama recebia anualmente US$ 186.000 da CIA. A inteligência indiana também financiou o líder religioso e outros exilados tibetanos. Ele se recusou a dizer se ele ou os irmãos trabalharam para a CIA. A agência também se negou a comentar.44

Em 1995, o jornal News & Observer of Raleigh, da Carolina do Norte, publicou uma foto colorida de primeira página do Dalai Lama sendo abraçado pelo senador republicano reacionário Jesse Helms, sob a chamada “Budista cativa herói da direita religiosa.”45 Em abril de 1999, junto com Margaret Thatcher, o Papa João Paulo II e George Bush (pai), o Dalai Lama pediu ao governo britânico que libertasse Augusto Pinochet, o ex-ditador fascista do Chile e cliente de longa data da CIA, que estava visitando a Inglaterra quando foi preso. O Dalai Lama fez um apelo, para que Pinochet não fosse forçado a ir para a Espanha, onde era processado por crimes contra a humanidade.

Já no século XXI, por meio do Fundo Nacional para a Democracia (National Endowment for Democracy) e outros canais cujos nomes soam mais respeitáveis do que a CIA, o Congresso dos EUA continuou alocando anualmente US$ 2 milhões para os tibetanos na Índia, com milhões a mais para “atividades relacionadas à democracia” no âmbito da comunidade de exilados tibetana. Além desses recursos, o Dalai Lama recebeu dinheiro do financista George Soros.46

A despeito de suas associações com a CIA e várias personalidades reacionárias, o Dalai Lama frequentemente falava de paz, amor e não-violência. Ele mesmo, realmente, não pode ser culpado pelos abusos do antigo regime tibetano, já que tinha apenas 25 anos quando fugiu para o exílio. Em uma entrevista de 1994, ele declarou favorecer a construção de escolas e estradas em seu país. Disse que a corveia (trabalho forçado e não pago dos servos) e determinados impostos cobrados dos camponeses eram “extremamente ruins”. E disse que não gostava do modo como as pessoas eram oneradas com dívidas antigas transmitidas de geração em geração.47 Durante o meio século em que viveu no Ocidente, ele abraçou conceitos, como direitos humanos e liberdade religiosa, ideias amplamente desconhecidas no Tibete antigo. Ele até mesmo propôs democracia ao Tibete, com uma constituição escrita e uma assembleia de deputados.48

Em 1996, o Dalai Lama soltou uma declaração que deve ter deixado desconfortável a comunidade exilada. Em parte, ela dizia: “O marxismo está baseado em princípios morais, ao passo que o capitalismo se preocupa apenas com ganhos e lucratividade.” O marxismo promove “a utilização equitativa dos meios de produção” e se preocupa com “o destino das classes trabalhadoras” e “as vítimas da […] exploração. Por esses motivos, esse sistema me atrai, e […] acredito que sou meio-marxista e meio-budista.”49

Mas ele também enviou uma mensagem tranquilizadora para “aqueles que vivem em abundância”: “É bom ser rico… Esses são os frutos de ações merecedoras, a prova de que eles foram generosos no passado.” Já aos pobres, ofereceu a seguinte admoestação: “Não há nenhuma boa razão para se tornar amargo e se rebelar contra aqueles que têm bens e riquezas… É melhor desenvolver uma atitude positiva.”50

Em 2005, o Dalai Lama assinou uma declaração amplamente divulgada junto com dez outros laureados com o prêmio Nobel, apoiando o “direito humano fundamental e inalienável” dos trabalhadores em todo o mundo de formarem sindicatos, a fim de proteger seus interesses, em consonância com a Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas. Em muitos países, “esse direito fundamental é tibiamente protegido e, em alguns deles, é explicitamente proibido ou brutalmente reprimido”, diz a declaração. Birmânia, China, Colômbia, Bósnia e alguns outros países foram destacados como estando entre os piores infratores. Mesmo os Estados Unidos “fracassa na proteção adequada do direito dos trabalhadores de formar sindicatos e negociar coletivamente. Milhões de trabalhadores estadunidenses não dispõem de nenhuma proteção legal para formar sindicatos…”51

O Dalai Lama também deu apoio total à remoção de obstáculos tradicionais enraizados que haviam impedido as monjas tibetanas de terem acesso à educação. Ao chegarem no exílio, poucas delas sabiam ler ou escrever. No Tibete, seus dias eram inteiramente dedicados a orações e cantos. Mas, no norte da Índia, elas agora começavam a ler filosofia budista e a se engajar em debates e estudos teológicos, atividades que, no antigo Tibete, eram abertas apenas a monges.52

Em novembro de 2005, o Dalai Lama fez uma apresentação na Universidade de Stanford sobre “O Coração da Não-violência”, mas evitou fazer uma condenação generalizada de toda violência. Ações violentas que são cometidas para reduzir sofrimento futuro não devem ser condenadas, ele disse, citando a Segunda Guerra Mundial como um exemplo de um esforço valoroso para proteger a democracia. E o que dizer dos quatro anos de carnificina e destruição no Iraque, uma guerra condenada pela maioria do mundo – até mesmo por um papa conservador – como uma violação clara da lei internacional e um crime contra a humanidade? O Dalai Lama estava indeciso: “É muito cedo para dizer se a guerra do Iraque é certa ou errada.”53 Antes, ele havia demonstrado apoio à intervenção militar estadunidense na Iugoslávia e, mais tarde, à intervenção no Afeganistão.54

III. Fim da teocracia feudal

A depender do mito de Xangri-lá, no Tibete antigo, as pessoas viviam em simbiose feliz e tranquila com seus senhores monásticos e seculares. Lamas ricos e monges pobres, proprietários de terras abastados e servos empobrecidos estavam todos ligados entre si, igualmente sustentados pelo bálsamo reconfortante de uma cultura profundamente espiritual e pacífica.

Somos lembrados da imagem idealizada da Europa feudal apresentada por católicos conservadores, como G. K. Chesterton e Hilaire Belloc. Para eles, a cristandade medieval era um mundo de camponeses felizes nos braços seguros da Igreja, sob a proteção mais ou menos benigna de seus senhores.55 Novamente, somos convidados a aceitar uma cultura específica em sua forma idealizada divorciada de sua sombria história material. Isso significa aceitá-la tal como é apresentada por sua classe mais favorecida, por aqueles que mais se beneficiavam dessas circunstâncias. A imagem de Xangri-lá do Tibete tem tanta semelhança com a realidade histórica quanto a imagem pastoral da Europa medieval.

Vista em toda sua realidade sombria, o antigo Tibete confirma a opinião expressa em um livro mais antigo, de que a cultura é tudo, menos neutra. Ela pode funcionar dando legitimidade para uma gama de graves injustiças, beneficiando uma porção privilegiada da sociedade a um enorme custo para o resto da população.56 No Tibete feudal teocrático, os interesses dominantes manipulavam a cultura tradicional, a fim de ampliar sua riqueza e poder. A teocracia igualava ações e pensamentos rebeldes com influências satânicas. Ela propagava a suposição geral de superioridade dos proprietários de terras e a desprezibilidade dos camponeses. Os ricos eram representados como merecendo sua boa vida, e os mais humildes faziam jus a sua existência indigna; tudo codificado em ensinamentos sobre o resíduo cármico de virtude e vício acumulados de vidas pregressas, apresentado como parte dos desígnios de deus.

Os lamas mais afluentes eram apenas hipócritas que pregavam uma coisa e secretamente acreditavam em outra? O mais provável é que eles fossem genuinamente devotados a essas crenças que traziam resultados tão bons para eles. O fato de que sua teologia apoiava tão perfeitamente seus privilégios materiais somente fortalecia a sinceridade com a qual ela era aceita.

Poder-se-ia dizer que nós, habitantes do mundo secular e moderno, não conseguimos compreender as equações de felicidade e dor, contentamento e costumes, que caracterizam sociedades espirituais mais tradicionais. Isso é provavelmente verdade e pode explicar a razão por que alguns de nós idealizamos essas sociedades. Ainda assim, um olho vazado é um olho vazado; um açoitamento é um açoitamento; e a exploração opressiva de servos e escravos é uma brutal injustiça de classe qualquer que seja a embalagem cultural. Há uma diferença entre um vínculo espiritual e a servidão humana, mesmo quando ambas existam lado a lado.

Muitos tibetanos comuns querem o retorno do Dalai Lama a seu país, mas parece que relativamente poucos querem um retorno da ordem social que ele representava. Uma matéria de 1999 no Washington Post observa que o Dalai Lama continua a ser reverenciado no Tibete, mas poucos tibetanos dariam as boas-vindas a um retorno da corrupção dos clãs aristocráticos que fugiram com ele em 1959 e que constituem o grosso de seus conselheiros. Muitos agricultores tibetanos, por exemplo, não têm o menor interesse em devolver aos clãs as terras que ganharam durante a reforma agrária promovida pela China. Os ex-escravos do Tibete também dizem que não querem que seus ex-senhores retomem ao poder. “Já vivi essa vida uma vez”, diz Wangchuk, um ex-escravo de 67 anos que estava vestindo suas melhores roupas para sua peregrinação anual a Shigatse, um dos sítios mais sagrados do budismo tibetano. Ele disse que venerava o Dalai Lama, mas acrescentou, “Posso não ser livre sob o comunismo chinês, mas estou bem melhor do que quando era um escravo.”57

Deve-se notar que o Dalai Lama não é o único lama importante escolhido na infância como sendo uma reencarnação. Um ou outro lama ou tulku – um professor espiritual de pureza especial, eleito para ser reencarnado seguidas vezes – reencarnado pode ser encontrado presidindo a maioria dos monastérios mais importantes. O sistema tulku é exclusivo do budismo tibetano. Inúmeros lamas tibetanos alegam ser tulkus reencarnados.

O primeiro tulku foi um lama conhecido como o Karmapa, que apareceu aproximadamente três séculos antes do primeiro Dalai Lama. O Karmapa é o líder de uma tradição do budismo tibetano chamada Karma Kagyu. A ascensão da seita Gelugpa, chefiada pelo Dalai Lama, levou a uma rivalidade político-religiosa com a seita Kagyu que já dura 500 anos e que, atualmente, continua viva dentro da comunidade tibetana no exílio. O fato de a seita Kagyu ter tido um enorme crescimento, abrindo cerca de 600 novos centros ao redor do mundo nos últimos 35 anos, não ajudou muito a situação.

A busca por um tulku, lembra-nos Erik Curren, nem sempre foi conduzida naquele modo puramente espiritual retratado em determinados filmes de Hollywood. “Às vezes, as autoridades monásticas escolhiam um filho de uma família poderosa da nobreza local, para que o monastério tivesse maior influência política. Outras, elas indicavam uma criança de uma família da classe mais pobre, que teria menor poder para influenciar na criação da criança.” Ainda em outras ocasiões, “um senhor da guerra local, o imperador chinês ou até mesmo o governo do Dalai Lama em Lhasa poderia [tentar] impor sua escolha de tulku em um monastério por razões políticas.”58

Esse pode ter sido o caso da seleção do 17º Karmapa, cujo monastério no exílio está situado em Rumtek, no estado indiano de Sikkim. Em 1993, os monges da tradição Karma Kagyu tinham um candidato próprio. O Dalai Lama, junto com vários líderes dissidentes do Karma Kagyu (e com o auxílio do governo chinês!), apoiou outro menino. Os monges Kagyu acusaram o Dalai Lama de ter excedido sua autoridade, ao tentar selecionar um líder para a seita deles. “Nem seu papel político nem sua posição como lama em sua própria tradição Gelugpa lhe davam o direito de escolher o Karmapa, que é um líder de uma tradição diferente…”59 Como insistiu um dos líderes dos Kagyu, “Dharma diz respeito a pensar por você mesmo. Não quer dizer seguir automaticamente um mestre em todas as coisas, não importando o quanto esse mestre possa ser respeitado. Mais do que ninguém, budistas devem respeitar os direitos de outras pessoas – seus direitos humanos e sua liberdade religiosa.”60

O que se seguiu foram 12 anos de conflitos na comunidade tibetana no exílio, pontuada por revoltas intermitentes, intimidação, ataques físicos, inclusão em lista negra, litígio e corrupção oficial, além de saques e desestabilização do monastério de Karmapa em Rumtek por apoiadores da facção Gelugpa. Tudo isso fez com que pelo menos um devoto ocidental questionasse se os anos de exílio não serviram para acelerar a corrosão moral do budismo tibetano.61

O que ficou claro é que nem todos os budistas tibetanos aceitam o Dalai Lama como seu mentor espiritual e teológico. Embora ele seja chamado de o “líder espiritual do Tibete”, muitos veem o título como pouco mais do que uma mera formalidade. Isso não confere a ele autoridade sobre as quatro escolas religiosas do Tibete além da dele, “assim como chamar o presidente dos EUA de ‘líder do mundo livre’ não dá a ele nenhum papel no governo da França ou da Alemanha.”62

Nem todos os exilados tibetanos simpatizavam com a antiga teocracia de Xangri-lá. Kim Lewis, que estudou métodos terapêuticos com um monge budista em Berkeley, na Califórnia, teve a oportunidade de conversar longamente com mais de uma dezena de mulheres tibetanas que moravam no mesmo prédio que o monge. Quando ela perguntou como elas se sentiam sobre retornar à terra natal, o sentimento era unanimemente negativo. Inicialmente, Lewis supôs que a relutância delas tivesse relação com a ocupação chinesa, mas elas rapidamente a informaram de que não era esse o caso. Elas disseram que eram extremamente gratas “por não terem de se casar com quatro ou cinco homens, estarem grávidas quase o tempo todo”, ou lidarem com doenças sexualmente transmissíveis contraídas de um marido promíscuo. As mulheres mais jovens “estavam encantadas por terem acesso a educação, queriam o máximo de distância de qualquer religião e tentavam entender a razão por que os estadunidenses eram tão ingênuos [em relação ao Tibete]”.63

As mulheres entrevistadas por Lewis lembravam histórias das provações passadas por suas avós com monges que as usavam como “consortes da sabedoria”. Ao dormirem com os monges, falavam para as avós, elas ganhariam “os meios para chegar à iluminação” – afinal de contas, o próprio Buda teve de se deitar com uma mulher para alcançar a iluminação.

As mulheres também mencionavam o sexo “desenfreado” que os monges supostamente abstêmios e espirituais praticavam uns com os outros na seita Gelugpa. As mães falavam ressentidas sobre o sequestro de seus filhos pequenos pelos monastérios no Tibete. Elas alegavam que, quando um menino chorava pela mãe, diziam a ele “Por que você chora por ela? Ela o abandonou – ela é apenas uma mulher.”

Os monges que recebiam asilo político na Califórnia pediam ajuda estatal. Lewis, ela mesma uma devota durante uma época, auxiliava com a papelada. Ela nota que eles continuam a receber cheques governamentais no montante de US$ 550 a US$ 700 por mês, junto com acesso ao Medicare. Além disso, os monges moravam de graça em apartamentos lindamente mobiliados. “Eles não pagam por serviços públicos, têm acesso gratuito à Internet em computadores fornecidos para eles, junto com aparelhos de fax, telefones fixos e celulares, além de TV a cabo. Tudo de graça.”

Também recebiam um pagamento mensal de sua ordem, junto com contribuições e tributos de seus seguidores estadunidenses. Alguns devotos realizavam com entusiasmo pequenas tarefas para os monges, inclusive compras em supermercados e a limpeza de seus apartamentos e banheiros. Esses mesmos homens sagrados, Lewis lembra, “não veem nenhum problema em criticar estadunidenses por sua ‘obsessão com coisas materiais’”.64

Saudar o fim da antiga teocracia feudal no Tibete não significa aplaudir tudo a respeito do domínio chinês naquele país. Este ponto é raramente entendido pelos fieis ocidentais de Xangri-lá atualmente. O oposto também é verdadeiro: denunciar a ocupação chinesa não significa que temos de romantizar o antigo regime feudal. Os tibetanos merecem ser percebidos como um povo de verdade, não espiritualistas perfeitos ou símbolos políticos inocentes. “Idealizá-los” observa Ma Jian, um dissidente chinês viajando pelo Tibete (e que agora mora no Reino Unido), “é negar a eles sua humanidade.”65

Uma reclamação comum entre os adeptos do budismo no Ocidente é que a cultura religiosa do Tibete está sendo destruída pela ocupação chinesa. Em alguma medida, isso parece ser verdade. Muitos dos monastérios estão fechados, e a maior parte da teocracia parece ter passado para a história. O principal objetivo deste artigo não é determinar se o domínio chinês trouxe melhorias ou foi um desastre. A pergunta que está sendo feita é: que tipo de país era o Tibete antigamente. O que estou discutindo é a suposta natureza espiritual imaculada da cultura pré-invasão. Podemos defender liberdade religiosa e independência para um novo Tibete sem ter de abraçar a mitologia sobre o antigo Tibete. O feudalismo tibetano estava encoberto pelo budismo, mas os dois não podem ser equiparados. Na verdade, o antigo Tibete não era um Paraíso Perdido. Era uma teocracia repressiva e retrógrada de privilégio e pobreza extremos, muito distante de Xangri-lá.

Finalmente, é preciso dizer que, se o futuro do Tibete estiver localizado em algum lugar no paraíso de livre mercado emergente da China, então, isso não é um bom sinal para os tibetanos. A China exibe uma fantástica taxa de crescimento econômico de 8 por cento ao ano e está emergindo como uma das maiores potências industriais do mundo. Mas o crescimento econômico veio acompanhado de um aprofundamento cada vez maior na diferença entre ricos e pobres. A maioria dos chineses vive próximo ao nível de pobreza ou bem abaixo dele, ao passo que um pequeno grupo recém-criado de capitalistas lucra enormemente em colusão com autoridades suspeitas. Burocratas regionais exploram o interior até o caroço, extorquindo pagamentos da população e saqueando o erário público local. A compra de terras nas cidades e no interior por incorporadoras e autoridades corruptas às custas da população são ocorrências quase que diárias. Dezenas de milhares de protestos populares e distúrbios têm surgido em todo o país. Normalmente, acabam sendo reprimidos de maneira implacável pela polícia. A corrupção é tão predominante, chegando a incontáveis lugares, que até mesmo a liderança nacional, normalmente complacente, foi forçada a tomar ciência e a começar a se mover contra isso no final de 2006.

Na China, trabalhadores que tentam organizar sindicatos nas “zonas empresariais” dominadas por grandes corporações correm o risco de perder seus empregos ou de receber uma surra e ser presos. Milhões de trabalhadores nas zonas empresariais trabalham doze horas por dia, recebendo um salário de subsistência. Com o sistema de saúde agora sendo privatizado, tratamento médico gratuito ou a preços acessíveis não esta mais disponível para milhões. Homens têm se deslocado para as cidades em busca de trabalho, deixando o interior cada vez mais empobrecido e povoado por mulheres, crianças e idosos. As taxas de suicídio aumentaram drasticamente, especialmente entre as mulheres.66

O meio ambiente chinês, infelizmente, está poluído. A maioria de seus famosos rios e muitos de seus lagos estão mortos, causando uma enorme mortandade nos peixes devido às toneladas de emissões industriais e dejetos humanos sem tratamento jogados neles. Efluentes tóxicos, inclusive pesticidas e herbicidas, infiltram-se nos lençóis freáticos ou diretamente nos canais de irrigação. As taxas de câncer nas vilas situadas ao longo das vias navegáveis dispararam, aumentando cerca de 1.000 vezes. Centenas de milhões de pessoas, residentes em cidades, respiram um ar classificado como perigosamente insalubre, contaminado pelo crescimento industrial e a recente inclusão de milhões de automóveis. Estima-se que cerca de 400.000 pessoas morrem prematuramente em razão da poluição atmosférica. As agências ambientais governamentais não têm poder de fiscalização para frear os poluidores e, geralmente, o governo ignora ou nega esses problemas, concentrando-se, em vez disso, no crescimento industrial.67

A própria elite científica chinesa relata que, a não ser que os gases de efeito estufa sejam contidos, o país estará sujeito a gigantescas quebras de safra junto com uma escassez catastrófica de alimentos e água nos próximos anos. No biênio 2006-2007, graves secas já afligiam o sudoeste da China.68

Se a China é a grande história de sucesso de um desenvolvimento rápido do livre mercado, e se ela deve ser o modelo e a inspiração para o futuro do Tibete, então, é possível que o antigo Tibete feudal comece a parecer ser bem melhor do que realmente era.

Notas:

  1. Mark Juergensmeyer, Terror in the Mind of God, (University of California Press, 2000), 6, 112-113, 157.
  2. Kyong-Hwa Seok, “Korean Monk Gangs Battle for Temple Turf”, San Francisco Examiner, 3 de dezembro de 1998.
  3. Los Angeles Times, 25 de fevereiro de 2006.
  4. Dalai Lama citado em Donald Lopez Jr., Prisoners of Shangri-La: Tibetan Buddhism and the West (Chicago e Londres: Chicago University Press, 1998), 205.
  5. Erik D. Curren, Buddha’s Not Smiling: Uncovering Corruption at the Heart of Tibetan Buddhism Today (Alaya Press 2005), 41.
  6. Stuart Gelder e Roma Gelder, The Timely Rain: Travels in New Tibet (Monthly Review Press, 1964), 119, 123; e Melvyn C. Goldstein, The Snow Lion and the Dragon: China, Tibet, and the Dalai Lama (University of California Press, 1995), 6-16.
  7. Curren, Buddha’s Not Smiling, 50.
  8. Stephen Bachelor, “Letting Daylight into Magic: The Life and Times of Dorje Shugden”, Tricycle: The Buddhist Review, 7, Spring 1998. Bachelor discute o fanatismo sectário e as disputas doutrinárias que não se ajustam muito bem à imagem ocidental do budismo como uma tradição não dogmática e tolerante.
  9. Dhoring Tenzin Paljor, Autobiography, citado em Curren, Buddha’s Not Smiling, 8.
  10. Pradyumna P. Karan, The Changing Face of Tibet: The Impact of Chinese Communist Ideology on the Landscape (Lexington, Kentucky: University Press of Kentucky, 1976), 64.
  11. Veja o relatório de Gary Wilson em Worker’s World, 6 de fevereiro de 1997.
  12. Gelder e Gelder, The Timely Rain, 62 e 174.
  13. Tal como observado ceticamente por Lopez, Prisoners of Shangri-La, 9.
  14. Melvyn Goldstein, William Siebenschuh, e Tashì-Tsering, The Struggle for Modern Tibet: The Autobiography of Tashì-Tsering (Armonk, N.Y.: M.E. Sharpe, 1997).
  15. Gelder e Gelder, The Timely Rain, 110.
  16. Melvyn C. Goldstein, A History of Modern Tibet 1913-1951 (Berkeley: University of California Press, 1989), 5 e passim.
  17. Anna Louise Strong, Tibetan Interviews (Pequim: New World Press, 1959), 15, 19-21, 24.
  18. Citado em Strong, Tibetan Interviews, 25.
  19. Strong, Tibetan Interviews, 31.
  20. Gelder e Gelder, The Timely Rain, 175-176; e Strong, Tibetan Interviews, 25-26.
  21. Gelder e Gelder, The Timely Rain, 113.
  22. A. Tom Grunfeld, The Making of Modern Tibet edição revisada (Armonk, N.Y. e Londres: 1996), 9 e 7-33 para uma discussão geral do Tibete feudal; ver também Felix Greene, A Curtain of Ignorance (Garden City, N.Y.: Doubleday, 1961), 241-249; Goldstein, A History of Modern Tibet, 3-5; e Lopez, Prisoners of Shangri-La, passim.
  23. Strong, Tibetan Interviews, 91-96.
  24. Waddell, Landon, O’Connor, e Chapman são citados em Gelder e Gelder, The Timely Rain, 123-125.
  25. Goldstein, The Snow Lion and the Dragon, 52.
  26. Heinrich Harrer, Return to Tibet (New York: Schocken, 1985), 29.
  27. Ver Kenneth Conboy e James Morrison, The CIA’s Secret War in Tibet (Lawrence, Kansas: University of Kansas Press, 2002); e William Leary, “Secret Mission to Tibet”, Air & Space, dezembro de 1997/janeiro de 1998.
  28. A respeito dos vínculos da CIA com o Dalai Lama e sua família e séquito, ver Loren Coleman, Tom Slick and the Search for the Yeti (Londres: Faber and Faber, 1989).
  29. Leary, “Secret Mission to Tibet.”
  30. Hugh Deane, “The Cold War in Tibet”, CovertAction Quarterly (Winter 1987).
  31. George Ginsburg e Michael Mathos Communist China and Tibet (1964), citado em Deane, “The Cold War in Tibet”. Deane observa que a autora Bina Roy chegou a uma conclusão parecida.
  32. Ver Greene, A Curtain of Ignorance, 248 e passim; e Grunfeld, The Making of Modern Tibet, passim.
  33. Harrer, Return to Tibet, 54.
  34. Karan, The Changing Face of Tibet, 36-38, 41, 57-58; London Times, 4 de julho de 1966.
  35. Gelder e Gelder, The Timely Rain, 29 e 47-48.
  36. Tendzin Choegyal, “The Truth about Tibet”, Imprimis (publicação do Hillsdale College, Michigan), abril de 1999.
  37. Karan, The Changing Face of Tibet, 52-53.
  38. Elaine Kurtenbach, relatório da Associated Press, 12 de fevereiro de 1998.
  39. Goldstein, The Snow Lion and the Dragon, 47-48.
  40. Curren, Buddha’s Not Smiling, 8.
  41. San Francisco Chronicle, 9 de janeiro de 2007.
  42. Relatório do Comitê Internacional de Advogados pelo Tibete, A Generation in Peril (Berkeley Calif.: 2001), passim.
  43. Relatório do Comitê Internacional de Advogados pelo Tibete, A Generation in Peril, 66-68, 98.
  44. Jim Mann, “CIA Gave Aid to Tibetan Exiles in ’60s, Files Show”, Los Angeles Times, 15 de setembro de 1998; e New York Times, 1º de outubro de 1998.
  45. News & Observer, 6 de setembro de 1995, citado em Lopez, Prisoners of Shangri-La, 3.
  46. Heather Cottin, “George Soros, Imperial Wizard”, CovertAction Quarterly no. 74 (Fall 2002).
  47. Goldstein, The Snow Lion and the Dragon, 51.
  48. Tendzin Choegyal, “The Truth about Tibet”.
  49. O Dalai Lama em Marianne Dresser (ed.), Beyond Dogma: Dialogues and Discourses (Berkeley, Calif.: North Atlantic Books, 1996)
  50. Esses comentários estão em um livro de textos do Dalai Lama citados em Nikolai Thyssen, “Oceaner af onkel Tom”, Dagbladet Information, 29 de dezembro de 2003, (traduzido para mim por Julius Wilm). A análise de Thyssen (em dinamarquês) pode ser encontrada em http://www.information.dk/Indgang/VisArkiv.dna?pArtNo=20031229154141.txt.
  51. “A Global Call for Human Rights in the Workplace”, New York Times, 6 de dezembro de 2005.
  52. San Francisco Chronicle, 14 de janeiro de 2007.
  53. San Francisco Chronicle, 5 de novembro de 2005.
  54. Times of India 13 de outubro de 2000; matéria de Samantha Conti, Reuters, 17 de junho de 1994; Amitabh Pal, “The Dalai Lama Interview”, Progressive, janeiro de 2006.
  55. Os Gelders fazem essa comparação, The Timely Rain, 64.
  56. Michael Parenti, The Culture Struggle (Seven Stories, 2006).
  57. John Pomfret, “Tibet Caught in China’s Web”, Washington Post, 23 de julho de 1999.
  58. Curren, Buddha’s Not Smiling, 3.
  59. Curren, Buddha’s Not Smiling, 13 e 138.
  60. Curren, Buddha’s Not Smiling, 21.
  61. Curren, Buddha’s Not Smiling, passim. Para livros favoráveis ao Karmapa indicado pela facção do Dalai Lama, ver Lea Terhune, Karmapa of Tibet: The Politics of Reincarnation (Wisdom Publications, 2004); Gaby Naher, Wrestling the Dragon (Rider 2004); Mick Brown, The Dance of 17 Lives (Bloomsbury 2004).
  62. Erik Curren, “Not So Easy to Say Who is Karmapa”, correspondência, 22 de agosto de 2005, www.buddhistchannel.tv/index.php?id=22.1577,0,0,1,0.
  63. Kim Lewis, correspondência para mim, 15 de julho de 2004.
  64. Kim Lewis, correspondência para mim, 16 de julho de 2004.
  65. Ma Jian, Stick Out Your Tongue (Farrar, Straus & Giroux, 2006).
  66. Ver o documentário da PBS, China from the Inside, janeiro de 2007, KQED.PBS.org/kqed/chinanside.
  67. San Francisco Chronicle, 9 de janeiro de 2007.
  68. “China: Global Warming to Cause Food Shortages”, People’s Weekly World, 13 de janeiro de 2007.

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